Jaiana Cruz

Imagina que você é o dono da Americanas (AMER3)…

Acompanhe e você vai sair daqui entendendo de uma vez por todas o que aconteceu com a empresa e por que muita gente está falando que ela vai quebrar

Imagina que você é dono da Americanas (AMER3). Todos os dias entram clientes na sua loja para comprar alguns produtos. Você tem esses produtos disponíveis porque compra dos seus fornecedores e os revende para seus clientes. Você é o meio-de-campo. E para esse jogo funcionar, você precisa controlar tudo nos mínimos detalhes. Isto é, você precisa contabilizar. Os principais players do jogo da contabilidade são o Balanço Patrimonial (Ativo e Passivo) e a Demonstração do Resultado do Exercício (Receitas e Despesas), também conhecida como DRE. Acompanhe até o final e você vai sair daqui entendendo de uma vez por todas o que aconteceu com a sua empresa e por que muita gente está falando que ela vai quebrar.

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No Balanço Patrimonial, você contabiliza tudo o que possui (bens e direitos) e tudo o que você deve (obrigações). Na D.R.E, você contabiliza tudo o que recebeu com as suas vendas (Receitas) e tudo o que você gastou para conseguir manter sua empresa funcionando (Despesas). As regras do jogo são as seguintes:

  • Para toda entrada existe uma saída, assim como para todo débito existe um crédito;
  • A soma do Passivo com o Ativo tem que resultar em zero (Balanço Patrimonial);
  • As Receitas menos as Despesas (D.R.E.) precisam gerar um resultado positivo (Lucro), senão, seu negócio possivelmente estará comprometido;
  • A função do Balanço Patrimonial é mostrar o caminho do dinheiro: de onde ele veio e para onde ele foi;
  • A função da DRE é mostrar se o caminho está certo, isto é, se está terminando em lucro ou se está atolando no prejuízo.

Entendido? Então vamos jogar!

Você comprou de um fornecedor R$ 10.000,00 em mercadorias e guardou no seu estoque. Vocês negociaram que essa compra tem um prazo de até 60 dias para ser paga. Portanto, o dinheiro não saiu do seu caixa agora, mas sairá daqui a 2 meses quando o boleto vencer. Isso precisa ser contabilizado. Lembra que para toda entrada existe uma saída? Nesse exemplo, entrou estoque na sua empresa hoje e vai sair dinheiro numa data futura. Em contabilidade nós falamos que “debitamos o ativo na conta estoques e creditamos o passivo na conta fornecedores”. Assim ó:

Percebeu que se você somar os dois valores a conta vai zerar? Perfeito! É assim que tem que ser. Há também impostos envolvidos nessa operação, mas vamos nos concentrar na parte básica, senão, você não vai querer ler esse artigo até o fim.

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No exemplo acima nós só contabilizamos as contas do Balanço Patrimonial (Ativo e Passivo). Isso porque as receitas e as despesas entrarão em cena somente depois, quando os produtos forem vendidos. E por falar em vendas, observe que seus clientes dificilmente pagam à vista. Dependendo do produto, eles costumam pagar em até 12 vezes. Mas lembra que o boleto a ser pago para o seu fornecedor vence daqui a 2 meses? Como você vai conseguir quitar essa dívida se o seu cliente só terminará de te pagar daqui a 1 ano? É aqui que entra o famigerado risco sacado, esse nome estranho que você vem ouvindo com frequência há duas semanas.

Basicamente, essa operação de risco sacado consiste em chamar uma instituição bancária para o jogo.

Como assim? Se você chegar para o seu fornecedor e pedir para aumentar o prazo do boleto, dificilmente ele vai aceitar, afinal, ele também tem que cuidar do capital de giro da empresa dele. Então, você bate na porta do banco e fala: “Banco, eu tenho esse boleto para pagar ao meu fornecedor em 60 dias, porém, isso vai prejudicar meu capital de giro, pois vou demorar muito pra receber o dinheiro do meu cliente referente a esse estoque que estou pagando. Preciso de um prazo maior. Nesse sentido, minha proposta é de que você pague o meu fornecedor e eu te pago só daqui a 180 dias, com juros. O que você acha?”.

Se o banco topar, isso precisará ser contabilizado.

Vamos supor que nessa operação de R$ 10.000,00 os juros cobrados pelo banco serão de R$ 1.000,00. Você vai contabilizar zerando a conta fornecedores com o lançamento “ao contrário” (antes ele estava a crédito, agora você vai lançar a débito) pois você não deve mais ao fornecedor, e sim ao banco, e vai reclassificar o novo valor (R$11.000,00) para a conta “Empréstimos Bancários”, não esquecendo de provisionar os juros (encargos financeiros) em uma conta redutora. Assim ó:

Daqui a 180 dias, quando você pagar o empréstimo com juros para o banco, você vai reconhecer esses R$ 1.000,00 de encargos lá na conta “Despesas financeiras, isto é, no resultado (DRE). Assim você estará calculando corretamente o resultado operacional da sua empresa informando que teve uma despesa com juros.

Mas, cá entre nós, não era esse o lançamento que você estava fazendo até agora, não é mesmo? Você acabou registrando essa operação de outra maneira durante anos, sem reconhecer a despesa de juros no seu resultado e sem apresentar o quanto estava devendo aos bancos por meio dessa operação de risco sacado. Ora, veja só, nem todos são adeptos da contabilidade criativa. Sergio Rial que o diga. Ele foi dar uma estudada nos balanços e… what a mess! “Não foi assim que aprendi na faculdade”, pensou ele. Operações de risco sacado reduzindo a conta “fornecedores” ao invés de aumentar a conta “financiamentos” ou “empréstimos bancários”? Hummm…peraí…deixa eu fazer umas ligações.

E aqui estamos nós, pensando no que você poderia fazer para não deixar sua empresa quebrar, já que os bancos não estão querendo negociar com você. Eles querem o dinheiro deles de volta. E como toda essa situação deixou sua credibilidade lá embaixo, vai ser difícil você conseguir uma forte capitalização ou um comprador que deseje assumir o seu passivo. Porque, sim, é altamente provável que você não consiga vender a sua empresa pelo preço que ela vale de verdade (ou pelo preço que você acha que ela vale), mas, pode acontecer de alguém se interessar em assumir as suas dívidas e tocar o barco daqui pra frente.

Como aconteceu com a Seara em 2013, por exemplo, ao ser vendida para a JBS (JBSS3). Na época, a Seara estava muito endividada e a Marfrig (MRFG3), dona da empresa, aceitou que a JBS apenas assumisse o passivo da companhia ao invés de receber uma grana pela venda. Duvido você adivinhar quem era o CFO da Seara no momento da transação. Vou te ajudar com as iniciais do nome: SR. Coincidências do mercado.

O grande ponto aqui é que você deve bilhões aos bancos (como eles estavam emprestando dinheiro pra você sem analisar a fundo a sua alavancagem, não sabemos). Você precisa negociar com eles para ganhar tempo e colocar as coisas nos eixos. Eu sei que essa história parece não ter fim, mas acredite, uma hora a solução aparece. Daqui a pouco uma nova diretoria passa a administrar o seu negócio e já já os noticiários vão parar de falar da sua empresa.

Assim você terá mais liberdade para conseguir analisar todas as probabilidades desse jogo. Veja, em dezembro estávamos discutindo incansavelmente a surpreendente postura populista do novo governo que jamais foi imaginada pelos agentes de mercado. Um presidente de esquerda despreocupado com as contas públicas e com a inflação? Como isso é possível?, diziam os polianas no final de 2022. Mas note que isso ficou lá em dezembro…

Agora estamos discutindo a surpreendente contabilidade criativa que você estava fazendo durante anos na Americanas e que jamais foi questionada pelos seus credores ou pelos seus auditores. E somente agora eles pararam pra pensar porque o KitKat sempre era mais barato na sua loja do que em qualquer outro lugar do mundo.

Fevereiro está abrindo os braços…qual será a próxima grande surpresa?

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Nota

Os textos e opiniões publicados na área de colunistas são de responsabilidade do autor e não representam, necessariamente, a visão do Suno Notícias ou do Grupo Suno.

Jaiana Cruz
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