Ex-executivos do IRB (IRBR3): Buffett como acionista foi um “grande mal-entendido”

A história de que Warren Buffett estaria numa lista de acionistas do IRB (IRBR3), que circulou em 2020, foi um grande mal-entendido, disse Fernando Passos, ex-CFO da empresa, à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), em documento sobre o processo ao qual o Brazil Journal teve acesso.

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A CVM apurou eventuais irregularidades relacionadas à empresa, que em fevereiro de 2020 havia informado — de forma falsa — sobre um aumento de participação da Berkshire Hathaway (BERK34), do megainvestidor Warren Buffett, em seu capital social. O caso gerou um processo administrativo sancionador contra os ex-administradores do IRB José Carlos Cardoso e Passos.

Cardoso, que era o CEO do IRB, foi acusado de falha em seu dever de diligência ao divulgar informação falsa ao mercado, sem verificação de veracidade. Passos, então CFO, foi acusado de perpetrar a irregularidade de manipulação de preços no mercado de valores mobiliários.

A Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos, a SEC, equivalente à CVM no Brasil, também está processando o ex-vice-presidente executivo de finanças do IRB (IRBR3) por mentir sobre o investimento que a Berkshire, de Buffet, havia feito na companhia.

Passos disse à CVM — segundo reportagem do Brazil Journal – que o “grande mal-entendido” sobre caso Buffet começou quando Cardoso, então CEO do IRB, disse que havia conversado com Ajit Jain, vice-presidente de seguros da  Berkshire: “O Jain teve uma conversa com o Cardoso dizendo que ele estavam investindo mais, aumentando nossas linhas de retrocessão. O Cardoso entendeu que ele estava falando em investimento em ações e conversou comigo. É a linha que eu penso hoje. O mercado, estressado, acabou entendendo isso”, relatou.

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A reportagem do Brazil Journal diz que Passos, depois da conversa com o então CEO do IRB, supostamente entendeu errado e simulou qual seria a participação de Buffett na resseguradora, com uma compra de 28 milhões de ações – deixando a empresa do megaivestidor como a terceira maior acionista do IRB, depois do Bradesco (BBDCS4) e do Itaú (ITUB4).

Ex-executivo em mensagem: “Bem-vindo, Buffett”

Passos disse então que enviou uma cópia da lista de acionistas para o time de RI do IRB, além de três conselheiros e Cardoso. O documento foi encaminhado com uma mensagem anexa: “Bem-vindo, Buffett.”

Segundo a reportagem do Brazil Journal, Cardoso contou em depoimento que foi informado da suposta participação de Buffett por essa mensagem e que considerou legítima: “Como inventariam algo assim?”

Mas a Berkshire Hathaway negou a informação, afirmando que “nunca foi acionista do IRB e não tinha intenção de se tornar um.”

Cardoso disse que ficou “chocado com o desmentido”, segundo reportagem do Brazil Journal. O ex-CEO disse que “teve vontade ao ouvir de Jain que a empresa de Buffett não ria comprar ações do IRB. Minha carreira, minha credibilidade foram arruinadas”.

A movimentação fez com que as ações do IRB subissem 7% e depois despencassem, o que acabou chamando a atenção da CVM. Os papéis do IRB chegaram a ser negociados com queda de 25%, a R$ 20,80.

A lista de mentira de acionistas veio a público depois que a Squadra divulgou uma carta em que questionava os números da empresa. A CVM, diz o Brazil Journal, afirma que os depoimentos de Passos e Cardoso “só reforçam a tentativa fantasiosa de ocultar a verdade. A autarquia acusa Passos de manipular preços do mercado.

A área técnica da CVM abriu um inquérito, na época, para avaliar as possíveis irregularidades em operações na B3 envolvendo as ações ordinárias e derivativos de emissão do IRB, no período de 1º de janeiro a 31 de março de 2020.

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“A denúncia alega que Passos criou e compartilhou com outros uma lista de acionistas falso que mostrou que Berkshire havia feito compras substanciais de ações da IRB. Passos também supostamente comunicou as informações falsas a analistas e investidores durante reuniões no Reino Unido e nos EUA”, diz o comunicado da SEC, sobre o caso de Passos.

O escândalo, à época, teve tanta magnitude que o CFO teve que renunciar do cargo de vice-presidente financeiro e de relações com investidores do IRB. O cargo era ocupado por passos desde meados de 2014.

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Junto com ele, também renunciou o presidente-executivo, José Carlos Cardoso.

Além disso, em 2020 a resseguradora iniciou uma investigação interna contra a sua antiga diretoria, como forma de apurar outros eventuais danos aos acionistas.

A CVM informou que existem outros três processos relacionados ao IRB em andamento na autarquia e que apuram, em especial, suspeitas de manipulação com papéis da resseguradora. Existe ainda um inquérito administrativo que apura eventuais irregularidades relacionadas à divulgação de informações por parte do IRB e seus administradores.

Hoje, as ações da empresa encerraram o pregão fecharam com queda de 0,94%, a R$ 2,10.

Mesmo com o histórico manchado, após a sua renúncia o ex-CFO do IRB fundou seu próprio banco, o Cactvs – uma fintech que oferece serviços financeiros para microempreendedores.

Atualmente, o banco digital já possui 100 mil clientes e 800 colaboradores.

Ainda que tenha tido diversos problemas com autoridades, em junho de 2020 Passos ganhou o prêmio de melhor diretor financeiro de instituições financeiras não bancárias da Institucional Investor.

A revelação foi tão bombástica que os papéis do IRB caíram de R$ 41,43 para R$ 6,47 em apenas dois meses, entre janeiro e março de 2020.

Desde então a companhia vem tentando recuperar a credibilidade junto ao mercado com o trabalho de estruturação. Mas os investidores permanecem examinando com lupa nas divulgações de resultados da companhia.

A carta da Squadra que questionou o IRB

Em fevereiro de 2020, a gestora de recursos Squadra Investimentos publicou uma carta em que questionava as práticas contábeis da resseguradora.

No documento, que constava mais de 30 páginas, a gestora apontava que os lucros recorrentes eram inferiores aos lucro contábeis reportados nas demonstrações financeiras da companhia.

“Desde que o IRB Brasil realizou sua abertura de capital em bolsa de valores, no ano de 2017, acreditamos ter encontrado fatores que, em nossa opinião, indicam lucros contábeis reportados nas demonstrações financeiras significativamente superiores aos lucros normalizados. Essa disparidade entre lucro reportado e lucro normalizado (recorrente) foi crescente durante esse período e atingiu sua maior diferença nos nove primeiros meses de 2019”, escreveu a gestora.

“Nesse processo, encontramos indícios que apontam lucros normalizados (recorrentes) significativamente inferiores aos lucros contábeis reportados nas demonstrações financeiras da Companhia. Essa disparidade entre lucro contábil e lucro normalizado foi crescente durante o período e atingiu sua maior diferença nos resultados trimestrais mais recente”, informava o relatório.

A história começou após a Squadra montar uma posição short, ou “vendida” (uma posição que lucra quando o preço da ação cai), em relação aos papéis da IRB. Com a posição já montada, a gestora divulgou dois relatórios, um no dia 2 e outro no dia 9 de fevereiro de 2020, apontando possíveis problemas contábeis na gestão da resseguradora.

A estratégia foi tiro e queda. Desde a divulgação do primeiro documento, de 154 páginas, a ação da empresa despencou.

Assim, a gestora indicava que a resseguradora apresentava, principalmente naquele último trimestre, uma rentabilidade mais elevada do que real. Por consequência, muito maior do que os pares do setor. E isso está impactando o preço da ação.

O mercado acompanhou a Squadra. A XP, por exemplo, colocou o ativo sob revisão após o relatório, sendo seguida por diversos outras gestoras.

A acusação, contudo, não passou despercebida pela IRB. Houve um contra-ataque da empresa. A companhia de resseguros acusou a Squadra de tentar influenciar na queda do preço das ações para se beneficiar – já que estava vendida na operação.

Além disso, o IRB acusou a Squadra de aumentar a posição em um terço pouco antes da divulgação do relatório, o que, segundo o documento apresentado à CVM, seria uma negociação atípica de ações que configuraria “insider trading”.

Segundo o Estadão, a segunda carta da Squadra foi divulgada uma semana antes do vencimento das opções de ações, que ajudaria a gestora a atenuar prejuízos de R$ 360 milhões acumulados desde o início da estratégia.

A Squadra tem uma opção de venda correspondente a um total de 910,9 mil lotes com 100 ações do IRB cada e que vence na próxima segunda-feira (17), segundo a publicação. Dessa forma, quanto menor a cotação das ações da IBR, maior o lucro da Squadra.

A CVM informou ao SUNO Notícias que abriu três processos administrativos acerca da conduta do IRB e da gestora Squadra.

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Marco Antônio Lopes

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