Guerra entre Rússia e Ucrânia pode pressionar a inflação no Brasil; entenda

A Rússia invadiu a Ucrânia na madrugada de quinta-feira (24) e iniciou uma guerra que os especialistas apontam como a maior desde a Segunda Guerra Mundial. Embora o conflito seja local, com perspectivas de maior impacto na Europa, o bolso dos brasileiros não deve sair intacto dessa situação. 

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Isso porque o ataque da Rússia à Ucrânia deve aumentar a inflação de forma global e, consequentemente, diminuir as chances de alívio do ciclo altista de juros pelo Banco Central (BC).

Rússia e a Ucrânia estão diretamente ligadas ao fluxo de produção e comercialização de diversas commodities, como grãos, fertilizantes, gás e petróleo, de modo que a invasão militar deve afetar os estoques dos produtos globalmente e influenciar na cotação dos preços internacionais.

Impacto no petróleo

A alta na cotação do petróleo tem sido um gargalo financeiro para o Brasil desde o ano passado. Por estar diretamente ligado ao preço dos combustíveis, quanto maior o preço da commodity, mais caro fica o litro de derivados como gasolina, diesel, etanol, entre outros.

O resultado disso é inflação na veia. Em 2021, os combustíveis foram um dos piores vilões para o aumento do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que fechou acima de 10%. A soma dos derivados do petróleo pesa cerca de 4% no valor do indicador de inflação.

Isso quer dizer que qualquer aumento no preço do petróleo impacta diretamente no bolso do brasileiro por causa do preço dos combustíveis: tem efeito no aumento da gasolina, na passagem do transporte público, no encarecimento de passagens aéreas e do frete de entregas, entre outros efeitos cascatas.

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“Dado o conflito bélico entre Rússia e Ucrânia, podemos ter um problema de médio prazo na continuidade da inflação de transportes, que vinha com a possibilidade de um alívio recente, mas agora fica um pouco mais pesado. Ou seja, como um dos cernes na inflação brasileira, que é o transporte junto com alimentos, se mantiver a pressão nos preços de petróleo é muito prejudicial para a economia local”, diz Jason Vieira, economista chefe da Infinity Asset.

E os efeitos começaram antes mesmo da guerra declarada. Desde a semana passada a cotação do petróleo registra altas consecutivas, culminando no preço recorde de US$ 103,05 o barril do petróleo Brent.

A disparada é um reflexo dos riscos para o estoque mundial do óleo com o conflito armado entre Rússia e Ucrânia. Isso porque a Rússia é o principal exportador mundial de petróleo. Em 2020, mais de 11% de todo o petróleo global exportado saiu do país de Vladimir Putin.

A capacidade de produção de petróleo da Rússia é de mais de 10 milhões de barris de óleo por dia. Para efeito comparativo, a capacidade de produção do Brasil é de menos de um terço disso: cerca de 3 milhões de barris diários.

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Alimentos mais caros

Plantação de milho
Plantação de milho. Foto: Pixabay

O segundo cerne da inflação brasileira – os alimentos – também deve ser afetado pelo conflito no leste europeu, encarecendo o custo de comidas básicas do brasileiro: pão e carne, principalmente.

Assim como o petróleo, as principais commodities que são matéria-prima para esses alimentos estão em risco com a guerra entre Ucrânia e Rússia. As duas nações juntas respondem por 29% das exportações globais de trigo e 19% do fornecimento mundial de milho.

E o caso das produções agrícolas é mais delicado do que o do petróleo. Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital, explica que a janela de produção de milho pela Ucrânia é pequena por causa do clima no país. Um bombardeio ou um conflito bélico na região pode colocar em xeque toda a safra ucraniana de milho.

“Imagine só o quarto maior exportador de milho do mundo não conseguindo produzir por causa da guerra. O resultado é um reajuste no preço do produto por conta da oferta”, diz Argenta.

E, diferentemente do que aconteceu com o petróleo, até a confirmação da invasão do território ucraniano pela Rússia nesta madrugada, a cotação do milho ainda não tinha sofrido grandes alterações. E o que faltou nos outros dias, em meio às incertezas, culminou nas negociações de hoje.

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As negociações de trigo e milho na bolsa de Chicago alcançaram os limites de alta permitidos, subindo mais de 5% na abertura do pregão, até que as operações fossem interrompidas. Na volta, partes dos ganhos foram devolvidos, para valorizações menores.

Por volta das 15h40 (horário de Brasília), a alta no preço do milho era de 2,06%, para US$ 695,32 o bushel. Já o trigo, no mesmo horário, subia 5,11%, para US$ 930,00 o bushel.

Para o Itaú BBA, uma escalada nos conflitos nas próximas semanas pode afetar a lavoura de trigo, que está em estágio de desenvolvimento, enquanto o milho pode ser impactado em termos logísticos – o primeiro trimestre do ano ser o mais forte nas exportações.

Além dos grãos em si, existe também a questão dos fertilizantes, essenciais para a lavoura moderna. A Rússia também é um dos maiores fornecedores globais dos produtos agrícolas, colocando em risco o abastecimento mundial e encarecendo os preços, que já passaram por fortes altas durante a pandemia.

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Saindo da Rússia e chegando ao Brasil

Uma das saídas que podem amenizar os riscos inflacionários para o Brasil é a chegada de investidores estrangeiros, que culminaria na queda do dólar: um movimento que foi visto dias atrás.

Paulo Cunha, CEO da iHUB Investimentos, explica que Rússia, Brasil e Turquia são destinos comuns de fundos globais que investem em países emergentes. Com a Rússia em guerra e a Turquia mais próxima geograficamente da batalha, o Brasil se torna o melhor destino para os investimentos. “Isso num segundo momento, claro. Porque logo de cara o cenário é de aversão ao risco globalmente, não sobra dinheiro para ninguém”, diz.

E não só isso: o CEO também reforça o papel do Brasil como exportador de commodities e hedge mundial em termos de proteção da carteira. “O Brasil também é um grande produtor de petróleo e de milho, como a Rússia, o que pode atrair os investidores e seus recursos”.

Principalmente com o valor dos juros nas alturas. Com a perspectiva de aumento da inflação globalmente com a guerra entre os países do leste europeu, a alta nos preços por aqui deve fazer com que o Banco Central mantenha o seu ciclo altista de juros.

Recentemente, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, afirmou que vai continuar usando a alta da Selic para conter a inflação e se aproximar o mais próximo da meta. Para os investidores isso é ótimo, já que a remuneração dos títulos públicos fica melhor, assim como a arrecadação federal.

“O Brasil é um dos países que mais pagam juros e remuneram seus investidores. Soma-se a isso a questão da escassez de oferta no mercado internacional em meio à guerra entre Rússia e a Ucrânia, o Brasil se torna um dos países mais atrativos do momento”, afirma Carla Argenta.

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Monique Lima

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