Drible no teto de gastos e interferência governamental pressionam juros e dólar

A economia brasileira vem sentindo os efeitos da instabilidade pela qual o País passa em meio à crise causada pela pandemia do novo coronavírus (covid-19) e pela intervenção do governo na economia. E o melhor termômetro para medir a insatisfação do mercado com é a disparada dos juros futuros e a pressão da alta do dólar ante o real.

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Para combater a desaceleração na economia com o retorno das restrições para combater o aumento dos casos de covd-19, o governo Bolsonaro busca colocar de pé uma nova rodada do auxílio emergencial e tenta controlar a inflação e o mau humor de caminhoneiros ao interferir na Petrobras (PETR4) para reduzir o preço dos combustíveis.

A reação do mercado, porém, tem tirado qualquer efetividade das ações intervencionistas do governo. Desde a troca do comando da Petrobras e o sinal de descumprimento do teto de gastos no auxílio, a curva de juros embicou para alta com os contratos de 10 anos alcançando os 9% – frente a uma Selic de 2%.

O dólar, por sua vez, disparou com a perspectiva negativa para a dívida pública com o desmonte da confiança no teto de gastos. Sem um teto para a moeda norte-americana, os combustíveis e demais commodities sofrem pressão e os preços internos devem acompanhar o exterior, provocando inflação. Bancos e agentes do mercado financeiro já reveem para cima a previsão de alta na taxa básica de juros (Selic) e para a moeda norte-americana ao fim deste ano.

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Segundo especialistas ouvidos pelo SUNO Notícias, a interferência sinalizou, de maneira mais forte, o abandono das políticas liberais pelo governo. Aliado a isso, a possibilidade de “dar um jeitinho” no teto de gastos pode endividar ainda mais o País, fazendo com que o mercado exija um pagamento maior

“A queda do presidente da Petrobras escancara o pensamento de uma boa parte do governo de que o Ministro da Economia, Paulo Guedes, está cada vez mais isolado. Esse é o grande ponto de incertezas na economia. A ideia de um governo liberal está mais enterrada e o governo deve operar com mais clareza”, disse Simone Pasianotto, economista-chefe da Reag Investimentos.

“O viés é populista dado que o governo viu que o auxílio emergencial fez a popularidade [do presidente] crescer. Então agora está muito escancarado o pensamento do governo”, completou.

No dia 19 de fevereiro, o presidente Jair Bolsonaro demitiu Roberto Castello Branco e indicou o general Joaquim Silva e Luna para a presidência da estatal.

Castello Branco assumiu a presidência da Petrobras no início de 2019, fazendo parte da primeira leva de indicações do governo Bolsonaro. Ele foi recomendado de forma direta pelo ministro da Economia Paulo Guedes, de quem é amigo desde a década de 80.

Mas, em meio a uma alta constante do preço dos combustíveis, Bolsonaro optou por substituir o presidente da Estatal.

Já em relação ao novo auxílio emergencial, conhecido popularmente como coronavoucher, o governo estuda oferecer quatro parcelas de R$ 250, nos meses de março, abril, maio e junho, a fim de combater os efeitos econômicos nocivos da pandemia da covid-19.

O problema, porém, é a forma de financiamento da ajuda. Segundo o jornal “O Globo”, o plano é retirar o Bolsa Família do teto de gastos, regra que limita o crescimento das despesas à inflação.

Dessa forma, o governo poderia gastar mais para bancar o benefício, em uma espécie de drible a lei orçamentária.

Juros e dólar serão afetados

O abandono de uma política econômica mais austera reflete nos juros do País. Só nesta quarta-feira (3), os contratos de juros futuros baseados no depósito interfinanceiro (D.I.) com vencimento em janeiro de 2027, na ponta longa da curva, avançavam 292 pontos base, com taxa de 8,32%. Já os com vencimento em janeiro de 2025 avançavam 295 pontos base, a 7,67%.

“Se há um descontrole nas contas públicas, os juros futuros têm a tendência de alta pois os sinais dados não são para uma consolidação fiscal. Quando você dá isenção a combustíveis, tem um lado político, mas também uma contradição a linha político-econômica. A Petrobras, pelo tamanho, também tem impacto no déficit público. Isso tudo faz os juros futuros subirem”, disse Ricardo Macedo, professor de economia do Ibmec RJ.

Para o professor, mesmo com tantas incertezas fiscais, não há, no momento, um debate sobre as reais necessidades do País, como a reforma tributária, por exemplo.

“Você tem todas essas questões fiscais e você começa a trabalhar para tirar o Bolsa Família do teto [de gastos]. O que tem que entrar no radar é justamente o poder de negociação do governo para colocar em prática algumas reformas necessárias, como reforma tributária. Você não ouve essa discussão”, afirmou.

Com o ambiente turbulento, menos investimento estrangeiro chega ao País, fazendo com que o dólar suba em relação ao real. Essa alta pressiona a inflação que, por sua vez, força a inflação -fazendo com que o governo estude uma alta na taxa básica de juros (Selic) para tentar controlar o aumento generalizado dos preços.

Bancos revisam Selic e dólar

Com a necessidade de o governo controlar o processo inflacionário, os agentes do mercado já passam a revisar -para cima- a Selic ao final deste ano.

O Itaú Unibanco (ITUB4) passou de a previsão da Selic para 5% a.a. já ao final de 2021, ante uma previsão de 3,50%. Já o Banco Inter (BIDI11), também revisou em meio ao Carnaval, e vê a Selic a 4% a.a.

“Estamos vendo um cenário com um pouco mais de inflação, principalmente puxada pelo câmbio, e de bens, com o retorno dos serviços, que pode puxar os preços. Tendemos a ter um IPCA próximo de 4% ao final do ano. Previsão de alta de 0,25 ponto percentual, mas com o stress desses últimos dias, não descartamos a possibilidade de 0,50 ponto percentual”, disse Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter.

“Com o cenário pior lá fora, que deteriorou o nosso câmbio, o BC possa antecipar uma normalização mais rápida do cenário”, completou.

Para Reag Investimentos, a taxa básica de juros deve ir a 4,5%, ante uma previsão de 3%, graças a pressão inflacionária. “Economia só gira bem com todo mundo seguro e transparência nos dados, mas estamos pisando em ovos com pandemia e turbulência gerada pela pauta confusa do governo Bolsonaro”, afirmou Simone Pasianotto, economista-chefe da Reag Investimentos.

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Vinicius Pereira

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