Coronavírus: relembre as epidemias que impactaram o mercado financeiro

Após um ano e meio de negociações, China e Estados Unidos entraram em acordo na primeira fase da guerra comercial. No entanto, aqueles que acreditavam que isso faria com que a economia global deslanchasse em 2020 não esperavam pela epidemia de coronavírus.

A doença, que já matou mais de 425 pessoas, infectou mais de 20,4 mil na China e chegou a 24 países, ameaça abalar o Produto Interno Bruto (PIB) da segunda maior economia do planeta. Com isso, o coronavírus provocou uma elevada volatilidade no mercado financeiro global no início deste ano e, aparentemente, não deverá sair de cena tão cedo.

A Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) e a Rússia já estão discutindo como responder à crise causada pela epidemia. Algo que poderia pressionar os maiores exportadores da commodity a diminuir a produção até o final do ano.

Além disso, o medo pela ampliação da doença fez com que a Rússia, Mongólia e Hong Kong fechassem as fronteiras com a China. O fluxo de pessoas no epicentro do coronavírus, na província de Hubei, onde fica a cidade de Wuhan, já está completamente bloqueado.

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A apreensão mundial com os desdobramentos do vírus fizeram com grande parte das maiores Bolsas de Valores de todo o planeta apresentassem certa instabilidade ao longo da semana. Na última segunda-feira (27), por exemplo, o S&P 500 abriu o dia caindo aproximadamente 15% e o Ibovespa fechou em queda de 3,29%.

Entretanto, desde o começo dos anos 2000, essa não foi a primeira vez que um surto epidêmico de nível internacional destabiliza os mercados financeiros. Relembre as principais epidemias que abalaram as Bolsas de Valores do mundo inteiro nos últimos anos.

Sars

No início do século, um surto de Síndrome Respiratória Aguda Grave (Saars) apareceu no continente asiático, matando 774 pessoas e infectando mais de 8 mil. O epicentro da epidemia foi na China e em Hong Kong, se desenvolvendo entre os meses de novembro de 2002 a junho de 2003.

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O medo da Sars interrompeu aulas e levou à imposição de barreiras ao trânsito de pessoas entre as cidades, sobretudo em Pequim, uma das maiores cidades do mundo.

A epidemia paralisou a economia local por quase três meses. Segundo uma pesquisa da consultoria britânica Capital Economics, em 2003, o número de passageiros que pegaram trens no primeiro dia do Ano Novo Lunar foi 57% menor do que no mesmo dia do ano anterior e o número de passageiros rodoviários apresentou queda de 45%.

E a redução das viagens de chineses impactou com as economias de toda a região, que tinham sido também impactadas pela epidemia. Somente os gastos dos turistas chineses são equivalentes a 2% ou mais do PIB em Hong Kong, Cingapura, Tailândia e Camboja.

“Estimamos que a Sars reduziu o crescimento da China em três pontos percentuais no trimestre mais afetado, embora a economia tenha se recuperado logo”, escreveu na época o economista-chefe de Ásia da consultoria, Mark Williams.

Naquele período, as principais Bolsas de Valores de todo o mundo não sofreram um impacto grande como nas demais crises financeiras. Isso também por causa da ainda pouca relevância econômica da China no planeta, e ao recém ingresso de Pequim na Organização Mundial do Comércio (OMC).

Em 2003 o PIB da China equivalia a 4,3% da economia mundial. Nos últimos 17 anos essa porcentagem quase quadruplicou, chegando a superar 16% do PIB do planeta. Por isso os efeitos do coronavírus são muito maiores.

Em novembro de 2002, a Shanghai Composite, principal índice acionário da China, atingiu 1.445 pontos, chegou a cair até 1.346 no mês seguinte, porém, em junho de 2003, final da epidemia, terminou com 1.516.

Saiba mais: FMI: é cedo para medir impacto do coronavírus na economia da China

O S&P 500, índice que replica o desempenho das 500 maiores empresas dos Estados Unidos listadas em bolsa, passou de 936 pontos em novembro de 2002, caiu cerca de 15% até fevereiro do ano seguinte, mas alcançou 968 em junho de 2003. 12 meses depois do surto da doença, o índice estadunidense havia valorizado 20,76%.

Já o principal índice acionário brasileiro, se recuperando de um mau 2002, saiu de 10.496 pontos em novembro de 2002 e caiu para um pouco menos de 10.290 em fevereiro de 2003. Entretanto, quatro meses depois, atingiu 13.021. Do início ao fim da crise, o índice da bolsa brasileira valorizou-se mais de 24%.

Gripe Suína

A gripe suína, ou H1N1, teve início em abril de 2009, no México. A doença, que já atingia os suínos, sofreu uma mutação e passou a infectar humanos.

Os serviços de saúde do país detectaram uma série de pneumonias graves junto à quadros gripais entre jovens e adultos, faixa etária de cerca de 80% das vítimas.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), entre abril de 2009 e agosto de 2010, 18,5 mil pessoas foram mortas por conta da H1N1. No entanto, de acordo um relatório de junho de 2012 da revista médica britânica The Lancet Infectious Diseases, da epidemia vitimou 15 vezes mais do que o divulgado. Segundo a pesquisa, o número de mortos pode ter ficado entre 151,7 mil e 575,4 mil.

O mercado financeiro, refletindo o medo da uma infestação global, operou de forma instável durante determinado período de tempo. Em 27 de abril de 2009, primeiro dia útil após a oficialização da epidemia, o Ibovespa caiu 2,04%. Entretanto, considerando o período inicial do vírus até o seu fim, a bolsa subiu 45%.

Nos Estados Unidos não foi diferente. Naquele dia, o S&P 500 caiu 1,01% e, até o término oficial do vírus, a bolsa americana registrou uma valorização de 35,96%.

Veja também: FMI: economia da América Latina avançará menos do que esperado em 2020

É importante ressaltar que, em 2009, junto à apreensão do surto da gripe, o mundo passava pela crise financeira do subprime. Os norte-americanos estavam em sua maior recessão desde a década de 1930, rompida em junho daquele ano.

Coronavírus

Pouco se sabe sobre a real origem do coronavírus. A “primeira versão” da doença que agora preocupa o mundo foi descoberta em 1960, no entanto, ainda não está claro como ocorreu a mutação que permitiu a infestação.

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Os primeiros casos suspeitos ocorreram no final do ano passado em pessoas que tinham algum tipo de contato com o mercado de frutos do mar em Wuhan. A cidade tem 12 milhões de habitantes, tamanho comparável a São Paulo. Em 31 de dezembro, a OMS divulgou o primeiro alerta. Atualmente, a organização já trabalha com um “elevado risco internacional“.

O coronavírus já ultrapassou o Sars em número de casos confirmados, no entanto, o número de mortos, por hora, é menor. Portanto, a doença preocupa, mas é menos letal, segundo autoridades.

Na última segunda-feira (27), primeiro dia útil após a massiva divulgação dos novos casos suspeitos do coronavírus, o Ibovespa fechou em forte queda.

As bolsas asiáticas, com exceção da chinesa, que esteve fechada, operam majoritariamente em queda a semana inteira, assim como o S&P 500.

É cedo para estimar assertivamente o impacto que o vírus poderá trazer para a economia real dos países. Fato é que o trânsito de pessoas está restrito e que algumas fábricas estão paralisadas, como é o caso da Tesla, Samsung e Foxconn.

Além disso, British Airways suspendeu os voos para a China e empresas de turismo sofrem com a desconfiança dos investidores, como é o caso da CVC (CVCB3) que, após um 2019 de forte desvalorização, caiu cerca de 17% na B3 apenas em janeiro.

O vírus poderá desencadear um ciclo de correção na bolsa?

O curto prazo é completamente imprevisível. Segundo o analista de mercados internacionais da SUNO Research, Alberto Amparo, “o investidor racional não deve prever o futuro”.

“O passado não é uma indicação do futuro, mas se olharmos algumas das epidemias passadas, vemos que não há uma correlação direta de desvalorização dos mercados em períodos de seis ou 12 meses depois dos surtos”, disse Amparo.

Segundo o analista, “ainda estamos em um estado incipiente no conhecimento do vírus. Se for uma epidemia duradoura, vários setores podem sofrer. Mas tudo vai depender de quanto vai se espalhar e quanto tempo irá durar”.

Portanto, em época de instabilidade na bolsa devido a um movimento de manada, o investidor de longo prazo deve se ater aos fundamentos das empresas, com ou sem coronavírus.

Jader Lazarini

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