Netflix pagará impostos na França, Espanha e Chile. E no Brasil?

Uma das maiores críticas feitas feitas para as Big Techs é ligada a questão tributária. Gigantes como Google (Nasdaq: GOOG; GOOGL), Amazon (Nasdaq: AMZN), Netflix (Nasdaq: NFLX), Facebook (Nasdaq: FB) ou Apple pagam impostos baixos demais? Ou, eles pagam impostos tout court?

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Perguntas que geraram problemas para essas empresas, principalmente de imagem. Pois acabam sendo acusadas de concorrência desleal por produtoras e distribuidoras de conteúdo de vários países. Entretanto, a Netflix parece querer mudar essa história.

A gigante do streaming modificou suas relações com as autoridades fiscais de França e Espanha. E aceitou pagar impostos às receitas de Paris e Madrid pelas assinaturas vendidas nos dois países europeus.

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Desde sua chegada nos mercados europeus, em 2014, a Netflix vendia assinaturas para clientes desses países, mas as notas eram emitidas pela filial Netflix International BV, fisicamente localizada na Holanda, mas com sede para fins fiscais nas Ilhas Cayman, famoso paraíso fiscal.

A partir do dia 1º de janeiro de 2021, segundo informações do jornal francês “Capital”, as assinaturas serão vendidas por CNPJs registrados na França e na Espanha.

De acordo com o jornal francês, a Receita de Paris poderia obter cerca de 800 milhões de euros (cerca de R$ 5 bilhões) por ano, na base dos 6,7 milhões de assinantes da Netflix no país.

Um porta-voz da Netflix confirmou que “estamos fazendo mudanças em nossa estrutura de negócios para melhor refletir o crescimento de nossos negócios na França. A partir de 2021, a receita gerada por nossos assinantes franceses será declarada na França e pagaremos o imposto corporativo de acordo. Após a abertura de nosso escritório em Paris em janeiro de 2020 e o lançamento de mais de 20 filmes e séries produzidos localmente, este desenvolvimento confirma nosso compromisso de longo prazo com as indústrias criativas francesas”.

Mesmo roteiro também na Espanha, onde a empresa teria por volta de 4,1 milhões de assinantes e 43% do mercado de plataforma de streaming de vídeo.

A decisão da Netflix também pode afetar outros gigantes da web, como Google, Airbnb e Apple, e outras plataformas de entretenimento rivais, que concentram suas receitas em países como Irlanda ou Holanda para reduzir seus impostos. A descoberta da Netflix chegará à Espanha alguns dias antes do imposto sobre serviços digitais, o chamado imposto do Google, entrar em vigor em 16 de janeiro.

Netfix acusada de sonegação fiscal

Essa mudança não chegou sozinha. No começo de 2020 a Netflix foi acusada de sonegação tributária por uma pesquisa realizada pelo site TaxWatch.

Analisando suas operações, o site acusou a empresa de enviar lucros milionários – calculados entre US$327,8 milhões e US$430 milhões – para paraísos fiscais como as Ilhas Cayman, com o objetivo de pagar menos impostos.

E os governos europeus, que já mantinham a plataforma na mira de suas receitas, não perderam ocasião de aumentar a pressão.

Especialmente em uma época como a atual, onde os enormes gastos provocados pela pandemia do novo coronavírus (covid-19) levaram muitos Executivos do Velho Continente a procurar freneticamente novas fontes de receitas.

A questão está sendo discutida até em fóruns internacionais, como a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), onde muitos países desenvolvidos já entraram em acordo para criar um conjuntos de mecanismos que permitam cobrar o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) de serviços digitais como a Netflix.

No caso, essas empresas deverão recolher o imposto no país de residência do consumidor, e não na sede legal ou fiscal de seu CNPJ.

Países vizinhos já tributaram a plataforma

Em 2020, diversos países da América Latina começaram a tributar a Netflix.

Em fevereiro o Chile criou um imposto de 19% sobre as operações de empresas digitais como Netflix ou Spotify, mesmo se as empresas não estarem estabelecidas fisicamente no país.

No caso da Argentina, em setembro foi criado um imposto de 35% sobre gastos em dólares através de cartão de crédito, que terá impacto direto na compra de assinaturas da Netflix.

E no Brasil?

No Brasil a situação é um pouco diferente, mas a polêmica sobre quantos impostos paga o Netflix é sempre muito forte.

Em 2020 a Netflix deverá faturar no Brasil cerca de R$ 6,7 bilhões, ultrapassando todas as operadoras de TV paga em número de assinantes. E caminhando rapidamente para superar as receitas da TV Globo já em 2022.

Questionada pelo SUNO Notícias sobre aspectos tributários de sua atuação no País, a empresa respondeu com um lacônico e-mail de 17 palavras: “A Netflix tem um escritório estabelecido no Brasil desde 2014, com CNPJ e agindo dentro da lei”.

Além da sede legal no Brasil, é necessário salientar que as leis tributárias brasileiras não contemplam um IVA nos moldes europeus, base de tributação dos serviços da Netflix na França e na Espanha, onde é de 20% e de 21%, respectivamente.

Por essas latitudes a carca tributária sobre o Netflix é muito mais branda. Em 2016 o então presidente Michel Temer sancionou uma lei que permitia taxar serviços de transmissão de áudio e vídeo, como o Netflix, com uma alíquota mínima de 2% do Imposto Sobre Serviços (ISS).

Segundo muitos economistas, como um dos maiores especialistas em contas públicas e sistemas tributários do Brasil, Bernard Appy, Netflix é sub-tributada no Brasil.

Opinião compartilhada também pelo Ministro da Economia, Paulo Guedes, que está estudando a criação de um novo imposto sobre pagamentos eletrônicos.

Em setembro, durante uma audiência virtual da Comissão Mista Temporária da Reforma Tributária do Congresso Nacional, Guedes indicou que a mudança modernizará o código tributário brasileiro, que não consegue cobrar corretamente os impostos de serviços Over The Top (OTT), como a  Netflix.

“O imposto digital é uma coisa para conversarmos à frente. Mas é claro que a economia é cada vez mais digital. Netflix, Google, todo mundo vem aqui, o brasileiro usa o serviço. São muito bem recebidos, são belíssimas inovações tecnológicas, mas ainda não conseguimos tributar corretamente”, explicou Guedes.

Entretanto, mesmo se o novo imposto sairá do papel, ele deveria ter uma alíquota entre 0,2% e 0,4%, prevendo uma arrecadação anual de R$ 240 bilhões.

O valor serviria para desonerar até 25% da folha de pagamento das empresas e financiar o novo programa social do governo, o Renda Brasil, que substituirá o Bolsa Família.

Entretanto, a proposta do novo imposto para Netflix não está presente no projeto de reforma tributária apresentado pelo governo federal ao Congresso em julho.

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Carlo Cauti

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