Marcos Figueiredo

Liberdade financeira é poder fazer escolhas

A educação financeira das crianças e adolescentes não precisa criar futuros milionários; basta ajudá-los a lidar com dinheiro com disciplina e planejamento

Quando os pais colocam os filhos para praticar um esporte, eles não costumam ter a expectativa de criar o novo Rafael Nadal ou a nova Serena Williams. Mas, curiosamente, quando converso com pais preocupados em dar educação financeira aos filhos, muitas vezes fico com a impressão de que eles desejam que seus filhos se tornem traders bem-sucedidos, quem sabe até o próximo Warren Buffet.

Essa visão é equivocada, simplesmente porque saber lidar com dinheiro é uma competência básica para a formação de cidadãos conscientes, e não apenas aqueles que pretendem trabalhar no mundo das finanças. Além disso, o objetivo principal de educar financeiramente as crianças e adolescentes deveria ser a criação de hábitos saudáveis que permitam a eles se tornarem adultos com liberdade financeira.

Mas o que é liberdade financeira? É preciso ter muito dinheiro no banco para ser livre financeiramente?

Eu vejo a liberdade financeira como a capacidade de fazer escolhas ao longo da vida, de forma tranquila e planejada, sem precisar se manter em situações pouco satisfatórias apenas porque não é possível sair delas. Uma pessoa livre financeiramente pode abrir mão de um trabalho pouco gratificante porque não depende dele para sobreviver no mês seguinte, pode fazer uma mudança de carreira ou dar uma pausa em um determinado momento. Para ter essa liberdade não é preciso ser milionário.

Basta ter controle sobre os gastos e uma reserva.

Sei que são poucas as pessoas que conseguem atingir essa situação. Por isso, é preciso ensinar desde cedo nossos filhos a desenvolver hábitos que permitam a eles chegar à vida adulta com as competências necessárias para construir essa liberdade.

Como desenvolver hábitos que ajudem os adolescentes a se tornarem adultos com liberdade financeira?

O primeiro hábito a ser desenvolvido é a capacidade de controlar os gastos, mantendo-se dentro do orçamento. Quando somos adultos e as contas não fecham, não adianta querer aumentar a receita: esse é um fator sobre o qual temos pouco controle. Mas podemos olhar com cuidado a forma como usamos nosso dinheiro. É claro que há situações em que a renda é realmente muito baixa, especialmente em um país tão desigual como o nosso. Mas, dentro de uma certa faixa de renda, é possível viver de acordo com os próprios recursos e construir a autonomia financeira. Isso pode — e deve — ser ensinado aos mais jovens desde cedo.

Para isso, combine uma semanada ou mesada e use-a como uma ferramenta para ensinar seus filhos a fazer suas despesas de acordo com a receita daquele período. É claro que no início haverá acertos e erros, que devem ser tratados como oportunidades de aprendizado. Se o dinheiro acabar antes da hora, avaliem juntos o que causou o estouro do orçamento e pensem em formas de planejar melhor os gastos. Com o tempo, eles irão consolidar o aprendizado de que o orçamento é limitado e que é necessário fazer escolhas e priorizar. Quando se chega a esse ponto, é hora de desenvolver a habilidade de poupar.

Muita gente pensa que construir a autonomia financeira é fazer sempre as apostas certas. Mas há inúmeros exemplos que comprovam: contar com um bom patrimônio financeiro não acontece apenas graças à rentabilidade dos investimentos, mas também por causa de aportes feitos com regularidade. É por isso que os especialistas em educação financeira reforçam sempre a importância de criar o hábito de separar, antes de gastar, uma parte de tudo o que se ganha — inclusive a mesada, no caso dos adolescentes. Este é um hábito muito saudável, que irá ajudá-los a manter uma reserva financeira ao longo de toda a vida.

Uma das pessoas mais simples e ricas que conheci foi um ex-funcionário do Banespa, que em sua aposentaria contava com uma reserva de R$ 20 milhões. Na época, eu atuava como especialista de investimentos de um grande banco e fui visitá-lo em sua casa, que não ficava em um bairro nobre da cidade. Ele me recebeu com um cafezinho, servido em uma mesa simples. Este senhor, que vivia essa vida modesta, conseguiu acumular uma reserva considerável poupando desde o primeiro dia em que entrou no banco como escriturário. Toda vez que recebia o salário, usava 20% do valor para comprar ações do próprio Banespa. Fazia o mesmo com o 13º salário. Quando recebia dividendos, reinvestia em ações. Ele fez isso durante 30 anos, e quando se aposentou havia acumulado uma pequena fortuna sem nunca ter recebido um alto salário nem grandes bônus.

Claro que este é um exemplo extremo, mas essa história é interessante porque mostra os benefícios de se manter uma forte disciplina quando se trata de saúde financeira.

Ela serve como inspiração para entendermos o poder da organização financeira. Nem todos nós conseguiremos acumular um valor tão alto. Mas podemos aprender com o exemplo de pessoas que conseguem manter o hábito de sempre reservar um pouco do que ganham para garantir o seu futuro.

Essa história pode servir como estímulo também para os mais jovens. Por mais difícil que seja, especialmente nessa fase da vida, é importante que eles entendam que a liberdade financeira é conquistada ao longo do tempo, e que para isso é necessário abrir mão do consumo agora para construir um patrimônio que será usufruído no futuro. Ter o hábito de aumentar as reservas de forma constante é o que vai dar a eles a autonomia desejada na vida adulta ou na terceira idade.

Seus filhos não irão se tornar experts em finanças fazendo cursos rápidos ou assistindo vídeos de influenciadores. Educação financeira requer tempo, prática, erros e reflexões. Não existe uma fórmula mágica para a liberdade financeira. A repetição dos conceitos e as lições aprendidas na prática vão ajudar a torná-los cidadãos conscientes e competentes financeiramente no futuro.

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Nota

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