Bruno Perottoni

Nem Governo, nem Banco Central: quem dita o ritmo são os mercados

E quando falo juros, não é 'só' sobre a Selic, afinal o cenário vai muito além disso.

Zugzwang é uma situação que ocorre em jogos de turnos, muito típica no xadrez, na qual o jogador se coloca em desvantagem pela obrigatoriedade de se mover. É uma boa analogia para descrever a posição atual do Comitê de Política Monetária (Copom) no Brasil. Costumo falar muito na mesa da tesouraria no banco onde trabalho que não tomar posição também é operar. Afinal, na falta de um cenário claro, o melhor a se fazer, às vezes, é não fazer, quando isso é possível. Mas reconheço que nem sempre se tem esse privilégio. Nesse caso, para mim, o Copom mesmo não tem. Então, está em Zugzwang: precisa se mover, mesmo em desvantagem. Explico.

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O que estamos assistindo é um embate simbólico entre o Banco Central do Brasil e o Governo. De um lado, o presidente do BC, mostrando-se um técnico e, como tal, adepto da boa e velha matemática, com números exatos, paramétricos e imparciais na gestão da curva de juros. Do outro, temos a política tentando ser populista, pregando que a inflação está sob controle, e que com os preços caindo, há espaço para a redução dos juros.

Não bastasse toda a efervescência do cenário local com dados de inflação que teimam em não ceder, um arcabouço fiscal que traz mais perguntas do que respostas, ainda tivemos uma audiência no Senado tentando explicar o óbvio para uma bancada de senadores que parecem teimar em não entender que política monetária é bem mais complexa que a vã filosofia política de planalto central.

Eis a situação de Zugzwang: mexer-se pode ser perigoso! Ceder às pressões do Governo e cortar juros sem as condições econômicas para tal é um tremendo risco, que pode ter um reflexo muito negativo para reputação do BC e cair como uma bomba no mercado de câmbio, fazendo o real voltar a se desvalorizar.

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O movimento do Copom pode ser exitoso, ou não, conforme o que farão os bancos centrais dos Estados Unidos e Europa. E o prognóstico não é bom, visto que ambos sinalizam altas de juros por lá.

Entendo que por aqui não há espaço para redução dos juros, embora o Governo continue pressionando e forçando com esse discurso. Ainda existe o peso do fato relevante sobre o aumento do teto de isenção de imposto de renda, com impacto importante na arrecadação do Governo e, consequentemente, impacto fiscal muito grande, o que dificulta ainda mais o cenário para um corte de juros brasileiros.

Então, espera-se que haja prudência da parte do Copom, no sentido de não ir contra ao movimento global de alta de juros e controle de inflação que vem preocupando o mercado de maneira geral, no mundo inteiro.

Em suma, muita atenção às decisões, comunicações e aos recados nas entrelinhas trazidos nos discursos das autoridades monetárias. Traduzindo isso tudo com a analogia ao jogo de xadrez que propus aqui, quero dizer que esse é aquele momento que o melhor estrategista é aquele que agirá com cautela, sabendo que em Zugzwang, às vezes, o melhor movimento é não se mover.

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Nota

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Bruno Perottoni
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