Receita Federal quer criar lista de nome sujo para contribuidor que age de má-fé

A Receita Federal propôs a criação de um Cadastro Federal do Devedor Contumaz (CFDC) para listar, com base em critérios objetivos, os contribuintes que, de acordo com o órgão, “agem de má-fé” e têm na inadimplência uma “estratégia” de negócio.

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Uma vez inseridos nessa espécie de lista de nome sujo, os controladores dessas companhias, caso cometam crimes tributários e sejam condenados, não teriam mais o direito de extinguir a punição ao realizar o pagamento do imposto devido – o que aumentaria as chances de prisão.

“Se o cara vai lá na sua casa e te assalta, ele não pode falar: ‘Desculpa, está aqui o dinheiro de volta’ e aí o crime é extinto. O devedor contumaz também não vai pode fazer isso”, afirma o secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas. “É melhor (esse tipo de devedor) ter um bom advogado criminalista, porque agora não vai bastar parcelar ou pagar (o débito irregular) para se livrar da responsabilidade criminal”, diz ele.

Essas novas regras estão propostas em um projeto de lei (PL) enviado na quinta-feira ao Congresso Nacional. O texto também estabelece diretrizes para os programas de conformidade, para premiar os bons pagadores de impostos, e amplia o controle sobre os benefícios fiscais recebidos por empresas.

Durante a apresentação do PL, o chefe do Fisco ponderou que o foco do CFDC não é o micro, pequeno ou até grande empresário, e nem mesmo o devedor recorrente, mas sim o devedor “qualificado”, que tenha uma dívida considerada irregular superior a R$ 15 milhões e que atenda a alguns requisitos.

Requisitos

Entre eles, que os R$ 15 milhões em dívida irregular superem o patrimônio da companhia. Ou seja, se tiver um patrimônio de R$ 100 milhões, por exemplo, não se encaixaria. “Agora, se tiver R$ 15 milhões de dívida e patrimônio de R$ 5 mil – acredite, isso acontece – esse cara é um picareta, é um devedor contumaz”, diz Barreirinhas.

A dívida também precisa existir por mais de um ano. “Ou seja, não foi um acidente. Ele não se deu ao trabalho de entrar com recurso administrativo, que já suspenderia (o débito). Ou, terminou o processo, e ele não garantiu em juízo”, afirma o secretário.

Ser parte relacionada em uma empresa que já foi punida com baixa nos registros ou com declaração de inaptidão do CNPJ também é outro requisito incluído pela Receita. “É o cara que fica abrindo e fechando empresa”, explica o secretário. “Ele já teve uma punição, abriu outra empresa e está devendo mais de R$ 15 milhões irregulares”, afirma.

A Receita Federal estima que mil empresas – o que representa 0,005% dos 20 milhões de contribuintes pessoa jurídica – se encaixem nesses critérios. Juntas, elas somam R$ 100 bilhões em débitos, segundo o Fisco.

“Haverá todo o contraditório e direito à ampla defesa. Antes de inscrever, eu vou avisar e dar a oportunidade de regularizar ou recorrer. Mas o fato de ele estar inscrito (no cadastro) permite que nós separemos o joio do trigo”, afirma Barreirinhas.

Ele destaca que o fato de o controlador estar no CFDC não significará que ele é um criminoso. “Mas, se for um criminoso e estiver no cadastro, quem sabe, poderá vir a ser preso um dia”, diz o secretário, destacando que, pelas novas regras, esse contribuinte não usufruirá do benefício da extinção da punibilidade em caso de pagamento ou parcelamento do débito irregular.

“A gente tem de começar a tratar o bom contribuinte como bom contribuinte, mas temos de parar de passar a mão em criminoso”, afirma o secretário da Receita. Para ele, esses devedores, que podem integrar a nova lista de nome sujo, “prejudicam o sistema tributário, o trabalho da Receita e os outros 99% dos contribuintes, que não conseguem concorrer com esse tipo de devedor”.

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Receita fará pente-fino em benefícios fiscais

Depois de focar nos grandes “jabutis tributários“, a Receita Federal promete fazer agora um pente-fino nos mais de 200 benefícios fiscais existentes no País. A maioria deles é considerada “invisível” por ter valores mais reduzidos – na casa dos milhões, e não dos bilhões – e pelo fato de o governo ter pouca informação e controle sobre eles.

A proposta, que consta de um projeto de lei enviado ao Congresso, prevê que as empresas serão obrigadas a preencher uma declaração eletrônica listando todos os incentivos que possuem. A partir daí, o Fisco pretende identificar as companhias em situação irregular, ou seja, que usufruem dos benefícios sem ter direito, e fazer, então, a exclusão.

“Muitos desses benefícios são aprovados no Congresso Nacional sem nenhum tipo de possibilidade de controle, porque eles são de autofruição (não tem pré-requisitos). O contribuinte recebe um benefício e, simplesmente, deixa de pagar o tributo”, afirma o secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas. “Isso tira a governança do poder público em relação a essas centenas de regimes.”

Segundo o secretário, o formulário será de fácil preenchimento, sem necessidade de envio de documentação. “A Receita vai puxar do sistema os documentos e verificar se a empresa preenche os requisitos para aqueles benefícios. Em seguida, vai informar se ela tem ou não direito.”

Uma companhia que tenha sido condenada pela Lei de Improbidade, por exemplo, não poderá fazer uso desses benefícios. Outros impedimentos podem estar relacionados à Lei Anticorrupção ou a legislações ambientais. Se estiver usufruindo do benefício indevidamente, o contribuinte estará sujeito a punições, além da exclusão do regime diferenciado.

Instrumentos

Segundo o secretário, atualmente o governo não consegue enxergar quem está sendo beneficiado por esses incentivos, com quais valores e se os objetivos da política pública estão sendo atingidos. “Com esse controle eletrônico, nós daremos instrumentos para, eventualmente, os Ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento e da Indústria analisarem os dados e os resultados da política.”

A ideia é que o mapeamento também auxilie o governo na tarefa de reduzir esses benefícios – como determina a própria Constituição. Isso porque, em 2021, o Congresso aprovou uma emenda que estabelece que, até 2029, o custo dessas medidas terá de ficar limitado a 2% do PIB. Atualmente, a estimativa é de que correspondam a 4,5% do PIB.

Segundo o Fisco, os benefícios fiscais serão incluídos nessa análise progressivamente. Os incentivos ligados ao Imposto de Renda da Pessoa Física, por exemplo, não entrarão no curto prazo, já que serão alvo de uma proposta de reforma que deve ser enviada pelo governo ao Congresso até o fim de março.

Bom pagador

Além da revisão dos benefícios fiscais, o projeto de lei enviado ao Congresso estabelece novas diretrizes aos programas de conformidade, para premiar os bons pagadores de impostos. Entre as recompensas previstas a esses contribuintes, estão a redução progressiva no pagamento da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), de até 3%, e a possibilidade de autorregulação em um prazo de 60 dias. Há também vedação de arrolamento de bens e preferência em licitações.

Segundo Barreirinhas, a ideia que norteia o projeto é o de uma Receita Federal que deixa de ser “punitiva” para ser “orientadora” dos contribuintes. O próximo passo será negociar o texto – que foi enviado com urgência constitucional, ou seja, prevendo tramitação acelerada – com os parlamentares, que retomam às atividades legislativas na próxima semana.

*Com Estadão Conteúdo

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Redação Suno Notícias

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