Mulheres investidoras e a aversão ao risco: entenda as razões por trás do perfil conservador delas

Não é novidade que o número de mulheres investidoras na bolsa de valores esteja crescendo. Mas o perfil delas continua o mesmo, apesar do avanço da educação financeira feminina. Com participação na B3 (B3SA3) de apenas 23,19%, ou 1,15 milhão até o final de 2021, as mulheres investidoras têm mais aversão ao risco do que o gênero oposto.

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No ano passado, a pesquisadora brasileira Rachel Borges de Sá foi em busca de uma explicação para o perfil mais conservador nos investimentos das mulheres. Descobriu o seguinte:

  • O “gap” salarial é real e afeta os investimentos delas, pois a maioria possui menores salários e benefícios de aposentadoria comparado aos homens;
  • O público feminino tem menos acesso à educação financeira;
  • Variáveis de interação social, incluindo sintomas de depressão, afetam o comportamento da investidora;
  • Por fim, o “medo de errar” leva a uma postura mais perfeccionista na hora de investir por parte delas, o que acaba atrapalhando.

De acordo com Tatiana Sadala, cofundadora do Todas Group, escola digital de negócios para mulheres, apesar da maior aversão ao risco, “uma coisa é fato: as mulheres acabam ganhando mais dinheiro do que homens em seus investimentos”.

Sadala destaca que o relatório “Women and Investing Study”, realizado pela Fidelity Investiments em 2021, revela que a carteira das mulheres teve um retorno superior ao dos homens em cerca de 0,4 ponto percentual ao ano, na média. “Com dados positivos, fica claro que nós, mulheres, precisamos falar mais sobre investimentos, dinheiro e finanças para que possamos nos sentir mais confortáveis para cada vez investirmos mais e melhor”, afirmou.

A aversão ao risco não é mito

A pesquisadora Rachel de Sá, mestre em economia política internacional, analisou carteiras de 3,34 mil investidores, dos quais 15,5% eram mulheres. De acordo com os resultados, o gênero pesava muito mais no nível de risco do que outras variáveis, como idade e patrimônio.

Alguns destaques da pesquisa:

  • Considerando a performance da carteira em doze meses, a volatilidade é 5,01 pontos percentuais mais baixa, em média, se o investidor for mulher, mantendo-se constante o valor para as demais variáveis independentes.
  • Considerando a performance da carteira observada no semestre, a volatilidade é 1,21 p.p. mais baixa para mulheres.
  • Avaliando clientes de perfil autodeclarado agressivo, por exemplo, ser mulher implica em uma redução da volatilidade observada, em média, de 2,23 pontos percentuais – controlada pelas demais variáveis independentes. Isso se compara a uma redução de 0,57 pontos percentuais na volatilidade observada a cada 10% de aumento no patrimônio líquido do cliente.

Em outras palavras, o simples fato de ser mulher é, sim, uma influência sobre o nível de volatilidade, ou seja, de risco da carteira.

Outro estudo que dá suporte à conclusão de Rachel foi o da Warwick Business School, do Reino Unido. Os pesquisadores acompanharam 2,8 mil investidores e suas carteiras ao longo de três anos.

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O estudo da Warwick, também divulgado em 2021, mostrou que as mulheres preferem ativos de menores riscos, enquanto homens tendem a entrar em investimentos especulativos. Por outro lado, como mencionado por Tatiana, a pesquisa também mostrou que as investidoras mulheres obtiveram uma rentabilidade maior, de 1,8% no ano.

Para Flávia Mello, investidora-anjo e co-fundadora do Sororitê, as mulheres também ficam com menos opções de alocação na hora de investir, por ter menor capital em mãos. “Quando falamos de Tesouro Direto, por exemplo, passa de 30% o número de mulheres que estão investindo. Diante disso, observamos que elas preferem investimentos mais seguros, com garantia maior de retorno”, afirma.

Além disso, de acordo com Mello, as mulheres são menos estimuladas a pensar em educação financeira. Socialmente falando, esse trabalho é colocado nas mãos do parceiro, “então a mulher não é estimulada a ser dona do seu próprio dinheiro, a decidir em relação ao seu próprio dinheiro. Isso também influencia nessa aversão delas ao risco — afinal, é um território desconhecido”.

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O injustificável “gap” salarial entre homens e mulheres

A razão mais predominante para mulheres não terem tanto espaço no mercado financeiro e investimentos é a do gap de gênero. Afinal, com uma renda menor, eventualmente leva mais tempo para conseguirem dominar os investimentos.

Conforme o último estudo anual do Fórum Econômico Mundial (FEM), a previsão para alcançar a equidade de gênero no mundo é de 136 anos. “Diante disso, precisamos ser intencionais para acelerar a participação da mulher em determinados espaços como por exemplo do investimento”, disse Tatiana.

“Uma mulher que começa a jornada dos investimentos motiva e inspira outras mulheres, que também têm vontade de se aventurar na área, a fazer o mesmo”, afirma. Ela ressalta que, até 1962, uma mulher não podia nem mesmo abrir uma conta bancária sem a permissão do marido.

A autonomia financeira para mulheres é uma conquista recente. “Agora, é preciso acelerar para aumentar representatividade, diálogo e educação em investimento, incluindo discussão de novas vias de investimento que envolvem maiores riscos, volatilidades e retornos, em que a presença feminina é ainda menor”, destaca.

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Para Flávia, o primeiro passo para diminuir o gap é com a educação financeira. “Precisamos estimular as mulheres, antes de mais nada”, afirmou, realçando que é extremamente necessário ter mais presença feminina para desmistificar o mundo dos investimentos, trazer familiaridade e até acompanhar carinhosamente, de alguma forma, as novatas nas finanças.

“Estamos falando de autonomia financeira, de independência, que são coisas importantes para serem cultivadas, independente do gênero. É necessário trazer mais exemplos de mulheres que fazem parte do mundo dos investimentos. Com o assunto ganhando cada vez mais projeção, mais mulheres terão acesso”, ressaltou, lembrando que o mercado de trabalho também precisa diminuir essa diferença de ganhos com urgência.

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Victória Anhesini

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