Retrospectiva 2018: um ano intenso para as fintechs

O ano de 2018 foi um ano muito intenso para as fintechs. Entre os muitos acontecimentos que ocorreram neste ano, está o primeiro IPO na B3, o do Banco Inter, que poucos meses depois sofreu um ataque hacker com vazamento de dados de 19 mil clientes; o surgimento da primeira e da segunda fintech unicórnio brasileiras, o Nubank e a Stone; a liquidação judicial do Banco Neon e a “Renascença” da Neon Pagamentos.

Nos últimos 12 meses, as fintechs se tornaram cada vez mais protagonistas do cenário financeiro brasileiro. Uma conquista de espaço que gerou temores nos bancos tradicionais, que com essa concorrência agressiva acabam perdendo mercado.

Mas o que é uma fintech?

A palavra fintech, que deriva da união das palavras “financial” e “technology”, refere-se à categoria de startups (modelo de negócios repetível e escalável) que buscam inovar e otimizar os processos do setor financeiro por meio da tecnologia.

Com custos operacionais mais baixos que dos bancos tradicionais, as fintechs surgiram com a ambição de minimizar a tendência burocrática dos serviços financeiros.

De acordo com a Associação Brasileira de Fintechs (ABFintechs), as fintechs são “um segmento de empresas na interseção entre os setores de tecnologia e serviços financeiros que adotam modelos de negócio escaláveis e que inovam em produtos e serviços direcionados para atender a uma determinada necessidade do cliente”.

Entre as principais características das fintechs estão:

  1. Atuação voltada para público sub-atendido;
  2. Solução baseada em tecnologia disruptiva;
  3. Altamente focadas.

Na distribuição das verticais financeiras, aquelas de meios de pagamento foram identificadas como maioria no segmento:

  • Meios de pagamento: 25%
  • Créditos, financiamentos e negociação de dívidas: 21%
  • Gestão financeira: 8%
  • Gestão de investimentos: 6%

Atualmente, o Brasil conta com cerca de 400 fintechs. Entre elas, cerca de 58% estão sediadas em São Paulo.

Confira abaixo os eventos que mais marcaram as fintechs em 2018:

O primeiro IPO na B3

O Banco Inter, cujo lema é a gratuidade de abertura de contas, no pedido de cartão e nas transferências, realizou no dia 27 de abril de 2018 o primeiro Initial Public Offering (IPO) na B3. Com a abertura de seu capital e alcançou um valor de mercado de R$ 1,9 bilhão.

Segundo os dados divulgados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), com as ações vendidas a R$ 18,50, a fintech captou R$ 722 milhões em sua abertura de capital.

De acordo com a diretora da ABFintechs, Ingrid Barth, “quando fintechs conseguem abrir capital em bolsa não significa apenas que elas estão crescendo, mas também que estão se estruturando internamente e criando modelos de governança fortes e processos transparentes”.

O Banco Inter foi fundado em 1994 como Banco Intermedium. A fintech pertence ao Grupo MRV Engenharia, da família Menin.

Em 12 de dezembro de 2018, o Banco Inter lançou a própria corretora de investimentos. Uma decisão que segue o movimento inciado pela Toro Investimentos em julho deste ano.

A corretora do Banco Inter contará com homebroker gratuito e não terá taxas de custódia e corretagem na compra e venda de ações.

O primeiro unicórnio

As startups são classificadas como unicórnios quando atingem valor de mercado superior a US$ 1 bilhão. Até meados de 2018, o Brasil contava apenas com dois unicórnios:

  • 99: comprada pelo aplicativo de transporte chinês Didi Chuxing por US$ 600 milhões em janeiro deste ano, e que recebeu um investimento de US$ 300 milhões na operação.
  • PagSeguro: cuja oferta inicial de ações na Bolsa de Valores de Nova York, Nasdaq, movimentou em janeiro US$ 2,3 bilhões.

O Nubank conquistou o título de unicórnio em maio deste ano, se tornando a primeira fintech unicórnio do Brasil. O banco, todavia, não seguiu trajetórias similares aos dos unicórnios mencionados. Segundo o fundador e presidente da empresa, David Vélez, a Nubank chegou ao valor de US$ 1 bilhão antes de realizar a rodada de investimentos.

A empresa, que mantém seu capital fechado, atraiu recentemente um aporte de US$ 180 milhões da gigante chinesa Tencent, que ficou com 5% de seu capital. Uma proporção que mostra como a fintech brasileira foi avaliada em cerca de US$ 4 bilhões.

Saiba mais – Investimento da Tecent no Nubank faz startup se tornar a mais valiosa da América Latina 

Fundado em 2013, o Nubank divulgou o balanço do primeiro semestre de 2018 com prejuízo de R$ 51 milhões. No entanto, não se trata de algo tão alarmante.

Segundo Barth, não se deve concluir se uma fintech está bem ou não apenas pelo seu balanço. “O Nubank é um exemplo positivo, que está levando adiante um excelente trabalho, inclusive popularizando o conceito de fintech e atraindo usuários e fãs. Quando começar a gerar resultados positivos, será de maneira exponencial – como vemos acontecer com frequência no Vale do Silício”, explicou Barth.

Sexta-feira tensa

No dia 4 de maio de 2018, uma sexta-feira, duas fintechs foram o centro de diferentes polêmicas.

Enquanto o Banco Central (BC) decretou a liquidação extrajudicial das atividades do Banco Neon, o Banco Inter foi acusado de um suposto vazamento de dados de 19 mil clientes. Um vazamento que, em seguida, o próprio banco confirmou.

No caso do Banco Neon, o BC motivou a decisão de liquidar a empresa por causa do patrimônio negativo de R$ 28 milhões e a acusação de aplicação de dinheiro dos clientes em uma empresa não-financeira que pertencia a sócios do Neon, a Pottencial Consultoria e Assessoria. O banco foi também acusado de não respeitar as regras de prevenção da lavagem de dinheiro.

A liquidação extrajudicial do Banco Neon ocorreu após a fintech receber aporte de R$ 72 milhões em uma rodada de investimentos. 

Já o Banco Inter sofreu uma tentativa de extorsão por parte de hackers, que culminou no vazamento dos dados de 19 mil clientes.

Em 19 de dezembro, o Banco Inter chegou a um acordo com Ministério Público do Distrito Federal sobre o vazamento dos dados dos clientes.

O banco, que no começo de 2018 se tornou a primeira fintech brasileira a realizar um IPO, pagará R$ 1,5 milhão para instituições de caridade e de combate a crimes cibernéticos.

Stone, o segundo unicórnio

Concorrente da PagSeguro, a Stone realizou uma oferta pública inicial em 25 de outubro deste ano. O IPO foi realizado na norte-americana Nasdaq e levantou US$ 1,5 bilhão.

De acordo com o investidor Rodrigo Wainberg, a abertura de capital na bolsa de Nova York reflete que o “modelo de negócio possui resultados menos consolidados”, já que um IPO na Bolsa de Valores de São Paulo (B3) demanda rentabilidade mais assegurada.

Ainda de acordo com Wainberg, o perfil do investidor brasileiro é conservador. Mas isso não impediu a Stone de atrair grandes investidores estrangeiros.

Em seu primeiro dia na bolsa, as ações da Stone, que iniciaram avaliadas em US$ 24, avançaram 30% e terminaram o dia em US$ 31,35.

O movimento chamou a atenção da Berkshire Hathaway, grupo do bilionário Warren Buffett, que adquiriu 11,3% de participação na Stone.

No terceiro trimestre de 2018, a Stone apresentou lucro de R$ 90,4 milhões. O total da receita no primeiro semestre deste ano foi de R$ 635,7 milhões.

Saiba mais – IPO faz donos da Stone faturarem mais de US$ 2 bilhões 

Neon Pagamentos

Sempre em 2018, a fintech Neon Pagamentos S.A., que operava em conjunto com o Banco Neon, conseguiu dobrar a base de clientes após a liquidação extrajudicial do banco de mesmo nome.

No começo do ano, a Neon Pagamentos ficou impedida de operar novas contas após o decreto do BC. Uma decisão baseada na perda do vínculo com uma instituição financeira. Os clientes da Neon Pagamentos também tiveram as contas bloqueadas por alguns dias.

Entretanto, apesar de atuarem juntas até maio deste ano, as fintechs Banco Neon e Neon Pagamentos possuíam personalidades jurídicas separadas.

Isso permitiu que a Neon Pagamentos se mantivesse no mercado mesmo após a liquidação do Banco Neon. Desta forma, com 600 mil clientes, a fintech fechou uma parceria com o Banco Votorantim.

Para a diretora da ABFintechs, a nova parceria foi essencial para o aumento no número de clientes. “Pela estrutura que a Neon construiu e constrói, foi importante ter encontrado um novo parceiro, como o Banco Votorantim. A mudança ajudou a consolidar a credibilidade da marca”, explicou Barth.

Que venha 2019

O mercado financeiro mantém boas expectativas para o segmento das fintechs em 2019.

Para Barth, “2018 foi um ano de superação de muitos desafios”. “As relações com os órgãos reguladores foram fortalecidas e o trabalho de ajudá-los a entender e também a educar a população foi fortalecido”, explicou a diretora da ABFintechs.

Na perspectiva de 2019, Barth explica que uma das prioridades é a difusão do conceito de fintechs, para que um público ainda maior possa considerá-las alternativas válidas às instituições financeiras tradicionais e como opções de investimento.

Amanda Gushiken

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