Copom desafia otimismo e mantém Selic em 15% mesmo após deflação
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O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) decidiu nesta quarta-feira (17) manter a taxa Selic em 15% ao ano, patamar mais alto em duas décadas. A decisão veio apesar da primeira deflação registrada em um ano e da melhora nas expectativas do mercado financeiro para a inflação de 2025.

Segundo o boletim Focus, em março a projeção para o IPCA era de 5,68%. Na última semana, caiu para 4,83%. O dado mais recente do IBGE mostrou recuo de 0,11% no índice em agosto, resultado influenciado pela redução das contas de luz com o bônus de Itaipu e pela queda nos preços de alimentação e bebidas.
Ainda assim, o Banco Central optou por não alterar sua estratégia monetária e justificou a decisão com base em riscos internos e externos.
Inflação de serviços e emprego seguem no radar
A queda de preços recente foi considerada pontual por analistas. Para Rafael Cardoso, economista-chefe do Banco Daycoval, o núcleo de serviços — que reflete a pressão da demanda e do mercado de trabalho — continua em um nível elevado, acumulando alta de 6,17% em 12 meses.
“Mesmo que a inflação geral mostre algum alívio, o que importa para o BC ainda não avançou de forma relevante”, afirmou Cardoso ao Valor Invest.
Ele destacou ainda que fatores como a sazonalidade e a valorização do real ajudaram a reduzir preços no curto prazo, mas sem garantir tendência de queda duradoura.
PIB perde fôlego e BC adota tom conservador
Os juros elevados já mostram efeitos sobre a atividade. O PIB cresceu 1,3% no primeiro trimestre, mas avançou apenas 0,4% no segundo. O IBC-Br, prévia do PIB, recuou 0,5% entre junho e julho, acumulando três quedas seguidas.
Mesmo assim, o mercado de trabalho continua aquecido, sustentando salários e consumo, o que reforça a cautela do BC. “O Banco Central passa uma mensagem conservadora, reconhece a melhora, mas de forma muito leve e com bastante ressalvas”, afirmou Cardoso. Para ele, o primeiro corte nos juros só deve ocorrer em 2026.
Comunicado do Copom veio mais duro que o esperado
Na ata, o Copom afirmou que o cenário internacional segue incerto, citando as políticas fiscais e comerciais dos Estados Unidos, e ressaltou que pode retomar o ciclo de alta se julgar necessário.
Segundo Gabriel Lago, planejador financeiro e sócio da The Hill Capital, o tom surpreendeu pela firmeza:
“O comunicado veio claramente mais hawkish. Além de reforçar que a Selic seguirá contracionista por um tempo prolongado, o Copom deixou explícito que pode voltar a subir juros caso o cenário piore”, disse.
Para Lago, a referência às tarifas comerciais dos EUA contra o Brasil foi um ponto novo e relevante. “Mostra que o BC está preocupado não apenas com a inflação interna, mas também com choques externos que podem pressionar o câmbio”, avaliou.
Ele acredita que a decisão deve ter reflexos imediatos nos mercados: “É provável que os juros futuros abram em alta e a bolsa tenha dificuldade para subir diante do tom mais duro do comunicado”.
O Copom deixou claro que a manutenção da Selic em 15% é uma estratégia que busca garantir a estabilidade econômica. Mesmo com sinais de alívio na inflação, o Banco Central não vê espaço para cortes no curto prazo e segue focado no controle da inflação, especialmente nos serviços e no impacto externo. A medida terá validade pelos próximos 45 dias, até a próxima reunião, e as atas completas serão divulgadas em até quatro dias úteis.