Patricia Nader

Investimento de impacto não é filantropia: é negócio

Embora ambas abordagens visem trazer soluções para causas sociais e ambientais, elas se diferem em pontos relevantes, que devem ser levados em consideração ao escolher uma ou outra modalidade de atuação

Nos últimos anos, o investimento de impacto se mostrou como uma alternativa atraente à filantropia tradicional. Embora ambas abordagens visem trazer soluções para causas sociais e ambientais, elas se diferem em pontos relevantes, que devem ser levados em consideração ao escolher uma ou outra modalidade de atuação. Talvez uma das principais diferenças nesse sentido esteja na intencionalidade, na expectativa de retorno.

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Isso porque o primeiro trata-se de uma estratégia econômica que busca ganhos monetários, seja por meio de dividendos, pagamentos de juros ou ganhos de capital, ao mesmo tempo em que entrega soluções sustentáveis e escaláveis para desafios socioambientais urgentes. Enquanto a atividade filantrópica, por outro lado, geralmente concentra esforços no efeito positivo gerado, com pouca ou nenhuma expectativa de lucratividade.

Outra característica que difere essas iniciativas e que pode representar uma vantagem de uma sobre a outra diz respeito ao potencial de sustentabilidade e escalabilidade. Neste sentido, os investimentos de impacto são pensados com a intenção de criar soluções sustentáveis e de longo prazo, o que significa continuar reverberando por muito tempo após o aporte inicial. Situação que contrasta com a filantropia, que geralmente envolve uma ação pontual com efeito limitado.

Além desse apontamento, vale destacar que os negócios de impacto são capazes de mobilizar uma soma de capital muito maior, além de atrair investidores de diversos perfis, desde indivíduos de alta renda até investidores institucionais, com muito mais poder para ações.

De acordo com o GIIN (instituição referência em investimento de impacto), em 2022, estima-se que o mercado mundial de investimento de impacto tenha ultrapassado, pela primeira vez, a barreira do trilhão em ativos sob gestão, chegando a US$ 1,2 trilhão (aproximadamente R$ 6,1 trilhões). Isso representa um marco relevante para uma indústria que ainda está amadurecendo e crescendo em sofisticação. E só por aqui, já fica claro a razão para a denominação de ‘negócio’ imputada para esse tipo de atividade.

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Há ainda uma expectativa de que esse mercado cresça a uma taxa de 18% ao ano (nos últimos 5 anos, os ativos sob gestão na categoria cresceram a uma taxa composta anual de 12%).

De acordo com uma pesquisa da The Business Research Company, é esperado que os millenials impulsionem ainda mais o segmento daqui em diante (principalmente dentro de um contexto mundial com COVID-19, guerra entre Rússia e Ucrânia e eventos climáticos catastróficos – que exacerbou os problemas). Esta geração está adotando uma abordagem nova para as questões sociais e ambientais e produção de riqueza. Eles acreditam que por meio dos investimentos sustentáveis pode-se aumentar a relevância da participação na mudança social e, ao mesmo tempo, conquistar transformações positivas de longo prazo para a sociedade.

Direcionando nosso olhar para o comportamento do setor no mundo, é possível concluir que a América Latina, junto com outras regiões em desenvolvimento, deveria representar uma parcela relevante do segmento e um solo fértil para os investimentos de impacto. Porém, de forma contraditória, de acordo com o GIIN, representa apenas 8% do mercado. Acho isso bastante incoerente, já que os maiores problemas sociais e ambientais estão em regiões menos desenvolvidas.

A América Latina (de acordo com o Banco Mundial), por exemplo, representa cerca de 5 ou 6% do PIB mundial e 8% da população do mundo. E embora a indústria de investimentos de impacto esteja em ascensão na região, tendo crescido mais de dez vezes em uma década, o mercado soma menos de 1% do total de ativos sob gestão de impacto. Logo, existe no continente uma gigantesca oportunidade para a promoção de iniciativas com o duplo propósito de resolver problemas estruturais e garantir retorno.

A base para essa conclusão em relação ao protagonismo da América Latina nesse sentido pode estar em números bem expressivos: é uma parte do globo que abriga quase 700 milhões de pessoas, que gera cerca de US$ 5,5 trilhões de riqueza, apesar de também representar 13% de todos os desempregados do mundo, sendo a região mais desigual do planeta. Isso sem falar que por aqui somos responsáveis por mais de 8% das emissões globais de carbono. Claramente, temos uma infinidade de problemas a serem resolvidos, sim, mas também representamos um ecossistema de investimento desenvolvido que nos garante as melhores condições para utilizar o capital privado em prol da solução de problemas, gerando retorno positivo e monetário ao mesmo tempo.

Em resumo, o investimento de impacto representa uma nova visão para as questões socioambientais que é diferente da filantropia, com o diferencial marcante de criar soluções sustentáveis e escaláveis que podem mobilizar um conjunto muito maior de capital, sendo uma opção de negócio bastante interessante sob diversos aspectos, incluindo motivos éticos, morais e financeiros. É claro que os filantropos também têm o seu papel fundamental na resolução de problemas, porém, é provável que o investimento de impacto continue a crescer em popularidade como uma ferramenta mais eficaz para alguns dos desafios mais prementes do mundo. O protagonismo das regiões nas quais esses problemas são mais proeminentes, como na América Latina, pode ser o agente transformador dessa indústria. Para funcionar, precisamos chamar a atenção e atrair capital, destravando portas importantes para o pleno desenvolvimento sustentável aliado ao retorno financeiro, uma premissa interessante dos negócios.

*Este artigo foi escrito por Patricia Nader, sócia e Head de Impacto e Relações com Investidores na Good Karma Partners, e Nicolas Gekker, responsável por investimentos na área de saúde na Good Karma Partners.

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Nota

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