Mauro Morelli

Os riscos do investidor extremamente conservador

A tradição do investidor brasileiro de ser ultra conservador tem muitos riscos, principalmente quando aplicada na carteira reservada à aposentadoria

Durante décadas, o investidor brasileiro foi acostumado a juros altíssimos, muitas vezes, os maiores do mundo. Isso poderia ser explicado pelas condições das nossas contas públicas que tinham necessidade de atrair capital estrangeiro de curto prazo ou até de controlar a inflação.

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Assim, o investidor brasileiro tinha retornos muito atrativos mesmo quando descontada a inflação do período.

O costume de altos retornos com pouca volatilidade trouxe um certo grau de acomodação ao investidor brasileiro. Essa acomodação teve como consequência um grande grau de aversão a risco, onde uma enorme maioria dos investidores brasileiros se auto intitula como conservadores ou extremamente conservadores.

Assim, estes encaram o risco financeiro como um pecado inadmissível.

O conservadorismo financeiro tem riscos importantes e não devem ser deixados de lado. Um exemplo claro aconteceu nos últimos meses. Podemos argumentar, e com razão, que esse período é muito atípico devido a pandemia. Mesmo assim, a lógica fica mais evidente dada a grandeza dos números.

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Investimentos indexados ao CDI, o ativo mais conservador no Brasil, tiveram retornos próximos a 7% nos últimos 24 meses. Porém a inflação oficial, medida pelo IPCA, foi superior a 10% nesse mesmo período. Já os fundos multimercados, representados pelo índice IHFA, tiveram retorno superior a 15%.

Como tivemos um juro real negativo nesse período, fica claro que o conservadorismo não foi remunerado a 7% e sim perdeu 3% do seu poder de compra,  aproximadamente. Isto é, o investidor conservador teve seus investimentos reduzidos em 3% em termos reais!

Seria razoável imaginar que 2021 seja diferente, mas a realidade é a mesma. A inflação do ano deve ser fechar acima dos 6%, enquanto o juro Selic ainda está em 4,25% e deve chegar acima de 6% apenas no final do ano.

Desse modo, o ano de 2021 deve continuar a ter juros reais negativos e se espera que o juro real fique positivo apenas durante o ano de 2022, apesar de ser algo em torno dos 2%.

O defensor do conservadorismo nos investimentos financeiros argumentaria que 2% ao ano acima da inflação é bastante atrativo e que é um bom retorno para quem não quer “correr riscos”.

Outro crítico pode colocar que o juro real neutro no Brasil é muito provavelmente superior a 2% a.a. A discussão sobre qual é o juro neutro é longa e inconclusiva. Mesmo que a taxa seja superior a 2%, e talvez seja mesmo, isso impacta todos os ativos de renda fixa no País, o que torna essa discussão não necessária no momento.

Vou propor um exercício e não irei considerar impostos simplesmente para facilitar as contas que não alterará a conclusão final: subindo na escala dos riscos de mercado que podem ser assumidos, saindo de ativos atrelados ao CDI, o próximo seria um título público atrelado ao IPCA (NTNB).

Considero esse ativo “com mais risco” pois geralmente tem prazos mais longos e uma volatilidade bem maior que ativos de curto prazo atrelados ao CDI. Esses riscos são minimizados pois a NTNB é garantida pelo tesouro nacional, o que faz com que ela seja muito mais conservadora que fundos multimercado ou ações. Atualmente a NTNB 2030 paga algo em torno de IPCA + 4 aa.

Comparando os números, temos que o CDI deve pagar algo como 2% a.a. acima da inflação e a NTNB paga 4% a.a., algo pouco atrativo em termos anuais. Por isso, vamos analisar para um período mais longo: 9 anos (vencimento aproximado da NTNB).

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Vamos imaginar que temos R$ 100 mil para aplicar e, por tanto, vamos aplicar 50 mil em cada um dos ativos CDI e NTNB.

Mantendo os juros reais constantes e desconsiderando a inflação e impostos: a aplicação em CDI terá saldo de R$ 59.754,63. Nas mesmas condições, a NTNB terá saldo de R$ 71.165,59.

Aplicação em CDI rendeu R$ 9.754,63 enquanto a aplicação na NTNB rendeu R$ 21.165,59, ou seja, um superior em R$11.410,96 com riscos pouco superiores.

Agora imagine esse exemplo em previdência privada, onde o horizonte de investimento muitas vezes é bem superior a 9 anos, podendo chegar a 30 ou 40 anos. E coloque nessa conta também um aumento de retorno real não de 2% a.a. para 4% a.a., mas para 6% ou 8% quando introduzidos outros ativos com maior retorno e risco.

Quando bem administrado, o risco do investimento é bem remunerado e é justificado pelo retorno superior. Já o conservadorismo numa aplicação de longo prazo penaliza esse retorno.

Tudo isso é agravado quanto mais longa é a aplicação. A tradição do investidor brasileiro de ser ultra conservador tem sim muitos riscos, principalmente, quando aplicada na carteira reservada à aposentadoria.

Nesse caso, o risco que se corre é ter uma aposentadoria com valores muito menores para o resto da vida!

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Nota

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Mauro Morelli

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