Gian Kojikovski

O papel aceita tudo, o investidor não deveria aceitar

O caminho não é torcer para o investimento dar certo, é identificar as boas oportunidades

Uma narrativa pode dizer qualquer coisa, inclusive mentiras. A publicidade – sem querer generalizar – sempre se utilizou de narrativas para atingir o consumidor. Algumas mais ancoradas na realidade, outras menos. Os consumidores, com o tempo, se acostumaram a entender que alguns exageros entram na conta da “licença poética” que as empresas têm para exaltar a qualidade de seus produtos. Faz parte.

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Muitos desses mesmos consumidores que entendem os limites da narrativa na publicidade não conseguem compreender que o mesmo storytelling – para usar o sinônimo mais utilizado recentemente – também serve para melhorar a avaliação do mercado e de seus investidores quanto ao ativo. Ou seja, quando sentam do outro lado do balcão, na posição de sócios minoritários, acreditam em qualquer historinha contada por executivos ou majoritários.

Não faltam exemplos históricos de narrativas vencedoras no curto prazo, mas que caem por terra quando analisadas acompanham mais de perto. Para relembrar o maior das últimas décadas no Brasil, quantos questionaram ou desconfiaram de Eike Batista quando ele montou o império bilionário do Grupo EBX? Algumas vozes se levantaram, mas era até difícil encontrar argumentos contra um grupo que prometia investimentos de US$ 50 bilhões no país e um empresário que chegou a ser o 6º mais rico do mundo. A narrativa era tão perfeita que, olhando em retrospecto, óbvio que não poderia ser real.

Eike ficou conhecido como o rei dos fatos relevantes. Era como se a cada fala do executivo, um poço de petróleo ou uma mina de carvão aumentassem de potencial produtivo. Em uma entrevista em 2010, ele chegou a afirmar que não queria que brasileiros deixassem de ganhar dinheiro e por isso ia vender 20% de sua participação na OGX. Sob os olhos do mercado de hoje, não consigo imaginar uma frase com mais conflito de interesse do que essa. Ao final de 2010, em uma lista com opinião de 30 analistas de bancos e corretoras, 15 deles indicaram OGX entre as 10 melhores ações para o ano seguinte.

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Os números pré-operacionais de uma empresa em um setor com altíssimo risco eram divulgados como se fossem fatos consumados. A demonstração de confiança nas falas levou a 6 IPOs das empresas do grupo entre 2004 e 2012. Ao todo, esses IPOs levantaram mais de R$ 20 bilhões e as empresas chegaram a valer mais de R$ 120 bilhões em seu auge. A cada fato positivo, os “torcedores de ação” da época, que não estavam no Twitter, mas em fóruns menores, comemoravam. Esses torcedores, quem diria, ressurgiram 10 anos.

Na hora de identificar os erros da narrativa, desculpe informar, o investidor pessoa física está praticamente sozinho. Quase toda a cadeia pela qual uma informação de um IPO passa até chegar ao investidor é remunerada por meio de comissão em ofertas – do banco de investimento às corretoras. Os bancos de investimento, por exemplo, levaram quase R$ 500 milhões em comissão nos IPOs do grupo. A imprensa, que não entra nisso, recebe informações desses agentes e nem sempre é fácil fugir das histórias repetidas por muitas pessoas do mercado.

Hoje, pouco mudou. Mesmo que existam mais players independentes. Ainda assim, é extremamente necessário que quem quer investir em renda variável saiba identificar as narrativas das empresas. O caminho não é torcer para o investimento dar certo, é identificar as oportunidades que te darão retorno mesmo que um idiota comande a empresa, já que, como diz Warren Buffett, algum dia um deles vai.

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Nota

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Gian Kojikovski

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