Bruno Perottoni

Quem veio primeiro, o ovo ou a galinha? E o que isso pode dizer sobre o dólar

O que mede, objetivamente, o apetite por dólares no nosso mercado? A taxa ou o custo da moeda? Pode parecer algo paradoxal, também, mas eu vou esclarecer.

No artigo anterior, eu trouxe algo abstrato como percepções de preço e isso fez parecer que entramos em alguma área menos ‘exata’ do conhecimento para falar de dólar. Logo eu que já escrevi sobre fazer contas…, mas tudo tem uma razão. Sendo assim, neste texto – o segundo de uma trilogia – eu digo o que mede, objetivamente, o apetite por dólares no nosso mercado? A taxa ou o custo da moeda? Pode parecer algo paradoxal, também, mas eu vou esclarecer.

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Para começar a desmistificar o assunto, eu convido a pensar na maneira como uma instituição financeira negocia o câmbio. Sabemos que bancos, nacionais e internacionais, são regidos por sérias regras e limitações sobre o quanto, e de que forma, podem tomar risco. Sabemos também que os spreads praticados são cada vez menores, fruto da concorrência aumentada e necessidade de ganhos de eficiência que os clientes demandam. Logo, é imprescindível encontrar e propor negociações que minimizem os riscos. Assim, se todos (ou a grande maioria) dos players buscam comprar e vender moeda e fazer hedge, tem-se uma modalidade “casada”, na qual a operação de câmbio à vista é concomitante com uma operação de proteção em contratos futuros. Eis, então, o que chamamos no mercado de ‘casado’.

É uma negociação entre instituições financeiras habilitadas a operar câmbio no Brasil, em ambiente regulado pela B3, e trata-se de um mercado de balcão, que até tentaram migrar para tela, mas sem êxito – um assunto que pode ser discutido em outro momento. Agora, por enquanto, basta saber que, basicamente, quem compra casado está comprando USD Spot e vendendo Dólar futuro, ou vice-versa.

E o que difere o preço de uma moeda “spot” de um derivativo com data de liquidação futura? Esse diferencial, conhecido como base em algumas literaturas, vem da diferença de juros entre as duas moedas envolvidas, e pode ser positiva ou negativa. Neste exemplo, vamos nos ater ao par USD x BRL.

Consideremos uma taxa de juros nos EUA de 5% ao ano (lembrando que são juros lineares/simples e convencionados em 360 dias corridos) e uma taxa de juros no Brasil de 13,65% (compostos, convencionados num ano de 252 dias úteis). Temos, para o final do mês, por exemplo, que o preço do futuro seria 1,003931 x o preço do spot. Pensando num USD/BRL Spot a R$ 4,800, teríamos um futuro valendo R$ 4,8188. Se o preço do futuro é a soma do spot e do casado, teremos um casado de dólar de R$ 4,8188 – R$ 4,800 = 0,0188 (ou 18,8, como negocia-se na prática). Vale lembrar que esse é um exemplo hipotético, sem pretensão de se “cravar” o resultado da conta, mas apenas para que se compreenda o conceito.

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Demonstrado de onde vem o diferencial, refletimos o que mede o apetite por comprar ou vender dólares no mercado de casado? Uma taxa de câmbio baixa pode fazer com que o apetite por compra de dólares aumente e esse diferencial entre spot e futuro, o enigmático casado, diminua. Ou seja, os players estariam dispostos a comprar a moeda norte americana a um custo maior, ou seja, com “desconto menor” em relação ao futuro… E, aqui, voltamos a cair numa área um pouco mais complexa, mas não menos importante, na qual a taxa de câmbio começa a se dissociar do custo do casado.

É claro que para uma empresa importadora, por exemplo, o preço do dólar é o que interessa, mas para uma instituição financeira, o cálculo dos juros que estão por trás da cotação é muito mais relevante. Isso porque, ele mede o custo do dinheiro e não necessariamente a taxa, como pudemos observar. E nesse contexto, a taxa passa a ser secundária para quem está tentando entender a precificação de uma moeda.

Eu sei que isso soa quase como um dilema do tipo: ‘ovo e a galinha’ – então, talvez para que fique mais claro, um player está comprando ovos, enquanto o outro está precificando a galinha. E isso é o casado, uma operação que também manda no valor do dólar, além das percepções de preço, mencionadas no artigo de abertura dessa minha trilogia.

Para fechar a série e entender tudo que – de maneira bastante complexa, reconheço – impacta no preço de uma moeda, vou falar sobre o que são esses juros, o cupom cambial, e como sua mensuração é importante para o entendimento desse mercado.

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Nota

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