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FII: Entenda o tombo do FAMB11B e o risco de confiar em apenas um inquilino

Um colossal espaço localizado no coração do Rio de Janeiro, na Avenida Rio Branco, marca o ponto onde se ergue o Edifício Almirante Barroso, a atual sede da Caixa Econômica Federal. Aqueles que passam ao redor conseguem encontrar uma variedade de serviços, de alimentação a mobilidade, além de livrarias, farmácias e bancas de jornal; mas o que pode não ocorrer ao espectador médio é que o imóvel, pertencente ao Fundo de Investimento Imobiliário (FII) FAMB11B que leva o nome do prédio, em poucas semanas será devolvido e o imponente edifício deverá ficar vazio, por um bom tempo.

No mês passado, o BTG Pactual (BPAC11), gestor e administrador do FII Edifício Almirante Barroso, comunicou ao mercado que a locatária Caixa, que ocupa há mais de 50 anos o arranha-céu de 22 andares, manifestou seu interesse de devolver integralmente o prédio, movimento previsto para se concretizar em menos de um mês, no próximo dia 30 de novembro. Com a saída iminente do banco estatal, o fundo imobiliário terá vacância de 100%.

Como consequência lógica, os investidores colocaram as cotas do FAMB11B, listadas na Bolsa de Valores de São Paulo (B3), em leilão. Os ativos despencaram do patamar de R$ 3 mil, do qual vinham se mantendo próximos desde a crise instaurada em março devido à pandemia, para cerca de R$ 1,6 mil em questão de dois dias. Atualmente, as cotas operam próximas de R$ 1.490. “O desdobramento de tudo isso é traumático”, afirmou o analista CNPI, especialista em Fundos Imobiliários da SUNO Research Marcos Baroni.

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Mas a decisão da Caixa não é nova e vem de longe, mais precisamente de dois anos atrás. A atual locatária comunicou sua intenção de desocupar o referido imóvel em outubro de 2018. A instituição financeira manifestou o interesse em permanecer somente em uma área de 2.411,80 metros quadrados da área de 54.017,66 metros quadrados do edifício. A data definitiva de partida integral, contudo, ficou pendente até o último mês de outubro.

No fato relevante de 2018, o BTG Pactual informou que estava em “processo de recolocar o imóvel no mercado com o objetivo de locá-lo o mais rápido possível, reduzindo a sua vacância futura.”

Para Bruno Nardo, gestor da RBR Asset Management, que cuida do segmento de fundos imobiliários, a atualização do prédio demanda um retrofit “grande e complexo”. O edifício é antigo, com pé direito baixo, e necessita trocar fachada, instalações, ar condicionado, elevadores, hall, assim como outros espaços. De acordo com o especialista, a obra pode custar de R$ 2 mil a R$ 3 mil por área útil do prédio e demorar pelo menos 12 meses.

Além disso, mesmo com um retrofit impecável, “não será fácil de locar pois o mercado do Rio de Janeiro está bem difícil”, ponderou Nardo.

Procurado pelo SUNO Notícias, o BTG Pactual não comentou o assunto até o fechamento desta matéria

Fundos imobiliários com características semelhantes

Mas o FAMB11B não está sozinho nessa. Existem em torno de cinco a 10 outros fundos de investimento imobiliário com “características similares” negociados na Bolsa, afirmou Baroni.

É o caso do Fundo de Investimento Imobiliário Torre Almirante (ALMI11), que possui 40% do Edifício Torre Almirante (não confundir com o Edifício Almirante Barroso, que, embora fique a poucas quadras de distância, é um imóvel distinto). Assim como o FAMB11B, o FII Torre Almirante tem apenas um único prédio corporativo situado em uma localização no centro da Cidade Maravilhosa.

E as semelhanças não param por aí. O ALMI11 também é administrado pelo BTG Pactual e era ocupado, além de uma agência da Caixa Econômica, integralmente por outra companhia estatal: a Petrobras (PETR4). O problema foi que a petroleira também comunicou sua intenção de devolver o imóvel, saindo de vez em 2017. Até hoje, três anos depois, o FII ainda não se recuperou, apresentando uma vacância próxima dos 80% e ainda tendo de arcar com os custos do edifício.

Pouco tempo depois, o XP Corporate Macaé Fundo de Investimento Imobiliário (XPCM11) também passa por dificuldades parecidas. Em meados do ano passado, o FII administrado pela Rio Bravo Investimentos e gerido pela XP Gestão informou ao mercado em geral que a Petrobras, também sua única inquilina, formalizou a intenção de descontinuar suas operações no Edifício Corporate Macaé, único imóvel de propriedade do fundo.

O XPCM11 registra somente um ativo localizado na cidade de Macaé (RJ) a 180 quilômetros da capital do Estado; e apenas um inquilino, que anunciou a permanência no imóvel até o final de dezembro de 2020. Com a saída da gigante brasileira, o imóvel passará a ficar totalmente vago fora do eixo corporativo da capital fluminense, o que pode afetar de forma negativa a posição de caixa do fundo no longo prazo.

Mas não é só no Rio de Janeiro que se desenha esse cenário, como mostra o Fundo de Investimento Imobiliário Centro Têxtil Internacional (CTXT11). O FII veio com uma proposta inicial de ser um centro de convenções e eventos da área têxtil, mas depois adaptou seu modelo para atender locatários corporativos.

O fundo tem como principal inquilino o Itaú Unibanco (ITUB4), que sozinha representa cerca de 95% da área locável do imóvel. Em abril, no entanto, a grupo financeiro anunciou sua intenção de devolução parcial, com a entrega de unidades que correspondem a 42% da área bruta locável. Com isso, o CTXT11, que já possuía uma vacância de mais de 9%, viu o indicador subir acima dos 50%.

Um Opala em meio a Up!

Ao investidor recém chegado à Bolsa ou que acabou de pousar os olhos sobre o universo dos FIIs, pode ser difícil imaginar que, em realidade, os fundos imobiliários monoativos e monoinquilinos reinavam no passado. Segundo Baroni, no início o Brasil não tinha um mercado desenvolvido e essa classe “cumpriu seu papel na história.”

Para se ideia, o mercado brasileiro de FIIs era tão enxuto que aqueles responsáveis pela venda das cotas de FIIs comparavam os papéis a ativos de renda fixa, lembra o analista da SUNO Research. A retórica, baseada no conhecimento ainda limitado dos investidores brasileiros e no receio quanto à renda variável, vendia fundos imobiliários como ativos com contratos de longo prazo, de anos de duração, para um grande cliente, como a Caixa, a Petrobras e o Itaú.

Não obstante, desde então a indústria vem se modernizando e o modelo de modelo de monoativo e monoinquilino “não dialoga mais com os negócios de hoje”, salientou Baroni. O especialista relacionou o formato com um Opala.

Apresentado no Salão do Automóvel de São Paulo de 1968, o Opala chegou como o primeiro carro de passeio da General Motors no País. Em pouco tempo, o veículo caiu nas graças dos brasileiros e se tornou um clássico por aqui. Quem conhece automóveis, entretanto, sabe dos problemas do Opala: o veículo não possui direção hidráulica, bem como outros mecanismos triviais de hoje, e o carro “bebe”. Dependendo do modelo, não chega a fazer mais de quatro quilômetros por litro na cidade. Bem diferente das classes econômicas atuais, que conseguem uma performance de mais de 10 km/L, como o hatch Volkswagen Up!, o mais econômico do Brasil segundo levantamento do Inmetro.

Do mesmo modo, de acordo com o analista de fundos imobiliários, a tendência dos FIIs monoinquilinos e monoativos é se tornarem “peças de colecionador”, assim como o Opala, “fruto de um não amadurecimento do fundo e do cotista” frente a um portfólio diversificado com uma gestão de caixa confortável, a verdadeira economia.

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Arthur Guimarães

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