Dividendos de FIIs e Fiagros ficam isentos, mas MP 1.303 ainda preocupa investidores

Os dividendos de fundos imobiliários (FIIs) e Fiagros voltaram a ficar isentos de tributação no relatório que modificou a Medida Provisória 1.303, divulgado nesta quarta-feira (24) no Congresso. O texto atual, no entanto, ainda preocupa investidores porque modifica o cálculo para a distribuição dos rendimentos.

O principal questionamento é a respeito de um artigo no texto que modifica o regime de cálculo dos dividendos de FIIs. Hoje realizado pelo regime caixa, com a obrigação de distribuição de pelo menos 95% dos lucros obtidos, esse cálculo passaria a ser feito pelo regime de competência, como já acontece com os Fiagros.

A principal mudança, na prática, é que decisões com impacto no valor patrimonial do fundo, como a remarcação de ativos de crédito ou a reavaliação de imóveis, feita anualmente, possam impactar o cálculo a ponto de suspender temporariamente a distribuição de dividendos.

O assunto foi tema de live comandada pelo professor Marcos Baroni, head de fundos imobiliários da Suno Research, com a presença do investidor profissional André Bacci e do economista Guilherme Almeida, da Suno Research. Durante quase duas horas, eles discutiram trecho a trecho do novo texto da MP, que precisa ser votada até 9 de outubro pela Câmara e pelo Senado, em dois turnos em cada uma das casas.

Dividendos isentos: o que mais mudou na MP?

A principal diferença em relação ao texto original publicado pelo governo em junho é que os dividendos distribuídos por FIIs e Fiagros deixam de ser tributados em 5%, na fonte. A isenção também volta para os rendimentos de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs), Cédulas do Produtor Rural (CPRs) e debêntures incentivadas, os títulos que financiam obras de infraestrutura.

A decisão, para os especialistas, reconhece o papel fundamental que o mercado de capitais vem exercendo no financiamento dos dois setores, o agronegócio e o mercado imobiliário, por meio da aquisição desses títulos, num momento em que o financiamento público está mais escasso.

Em contrapartida, as Letras de Crédito Imobiliárias e do Agronegócio (LCIs e LCAs), entre outras modalidades do setor, passam a ser taxadas em 7,5%, o que compensa a perda de arrecadação projetada para as outras modalidades.

No caso do ganho de capital, ou seja, o lucro na venda de cotas de FIIs e Fiagros, esse valor passa a ser tributado em 17,5%, em vez de 20% como acontece hoje. O mesmo valerá para o ganho de capital com ações, enquanto para os produtos de renda fixa a tarifa de 17,5% passa a ser única — antes, ela variava entre 15% e 22,5%, dependendo do tempo da aplicação.

A alegação do governo para essa mudança, que já estava no texto original da MP, é que a unificação da tarifa traz mais justiça tributária, uma vez que investidores com menos recursos tendem a precisar do dinheiro com mais facilidade e, por isso, seriam obrigados a pagar mais imposto no caso de um resgate antecipado.

Por que a mudança de regime preocupa especialistas?

O texto do artigo 44, o mesmo que cita a isenção dos dividendos, afirma no quinto parágrafo que a distribuição de rendimentos deve “respeitar o limite de lucros apurados segundo o regime de competência”. Já o sexto parágrafo reforça que os valores acima desses lucros deverão ser considerados como redução no custo de aquisição das cotas.

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Já o artigo 85 revoga partes da lei número 8.668, de 1993, que regula os fundos imobiliários, entre eles o artigo 10, que define a distribuição de 95% dos lucros em regime caixa a cada semestre.

Na prática, segundo especialistas, o novo texto faz com que qualquer registro de prejuízo de um mês para outro a ser registrado pelo administrador levará à possível suspensão temporária dos dividendos. Entre os exemplos citados por André Bacci durante a live são:

  • reavaliação patrimonial dos imóveis, a partir da reavaliação que é feita anualmente;
  • remarcação para baixo do valor patrimonial de CRIs, a partir da deterioração das condições de crédito do emissor;
  • remarcação para baixo do valor patrimonial de cotas de FIIs a partir da flutuação do preço de mercado, o que pode impactar diretamente os FOFs (fundos de fundos) e FIIs multiestratégia (hedge funds).

Ele lembrou que o caso ocorreu no ano passado com alguns Fiagros, após o registro de PDD (projeção para devedor duvidoso) para alguns CRAs emitidos por empresas que entraram em recuperação judicial. Nesse caso, a decisão vai depender dos administradores e da opção que for realizada para as demonstrações contábeis dos FIIs.

No caso dos CRIs, o investidor profissional afirma que hoje, quando há estresse em relação a algum papel que entrou em inadimplência, o valor patrimonial só é impactado se a gestão vende os referidos títulos e realiza o prejuízo em caixa. “Isso estimula a gestão a manter o ativo problemático no portfólio”, explica Bacci.

O que o investidor deve fazer?

Os especialistas lembraram durante a live que o atual texto ainda pode ser modificado por emendas até a votação em plenário. “Por enquanto nada vai mudar, então ninguém deve sair vendendo nada”, avisou Baroni. “A minha carteira vai continuar como está no curto prazo”, completou Bacci, reforçando o fato de que movimentações precipitadas podem causar prejuízo.

Baroni lembrou que, após a isenção dos dividendos, representantes do setor ainda tentam negociar com parlamentares novas mudanças no texto, a fim de manter o atual formato para o cálculo de distribuição de rendimentos. Ele completou dizendo que gestoras e administradoras podem se adaptar ao longo do tempo para garantir maior estabilidade aos investidores.

Fernando Cesarotti

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