Déficit maior acende alerta sobre as transações correntes e expõe fragilidade no fim do ano
As transações correntes voltaram a preocupar em outubro, quando o Brasil registrou déficit de US$ 5,1 bilhões, segundo o Banco Central, sinalizando enfraquecimento das contas externas mesmo após meses em que indicadores sugeriam melhora no balanço de pagamentos. O resultado veio pior do que o esperado e apareceu justamente no período em que a sazonalidade costuma pressionar as remessas de lucros e dividendos.
Embora o movimento não represente risco imediato, economistas apontam que a leitura exige atenção. O balanço ainda é financiado com relativa tranquilidade, mas depende cada vez mais da manutenção da confiança — doméstica e internacional — para evitar impactos sobre câmbio, juros e fluxo de capitais. Como resume Claudiner Sanches Junior, especialista da WFlow, “o resultado pior do que o projetado não é motivo de alarme, mas mostra perda de fôlego das contas externas”.
O que puxou o déficit das transações correntes
O relatório do Banco Central mostra que o déficit de outubro, apesar de menor que o de um ano atrás (US$ 7,4 bilhões), reflete pressões adicionais além da sazonalidade tradicional de fim de ano. Os dados apontam um quadro misto: a balança comercial teve superávit expressivo de US$ 6,2 bilhões, com exportações em alta de 8,9% e queda de 1,3% nas importações. Ainda assim, o bom desempenho do comércio exterior não foi suficiente para compensar o avanço das despesas externas.
A conta de serviços permaneceu pressionada, com déficit de US$ 4,4 bilhões. As despesas líquidas com viagens internacionais subiram 14,5% em relação ao mesmo mês de 2024, enquanto os gastos com propriedade intelectual cresceram 35,6%, somando US$ 995 milhões. O aumento de 142% nas despesas em serviços de telecomunicação, computação e informações reforça esse quadro de maior saída de recursos.
A maior deterioração, porém, veio da renda primária, cujo déficit alcançou US$ 7,4 bilhões, avanço de 12,7% sobre outubro do ano anterior. As despesas com juros subiram 31,7%, atingindo US$ 2,2 bilhões, enquanto lucros e dividendos enviados ao exterior somaram US$ 5,3 bilhões.
Investimentos ainda amparam o balanço, mas confiança é crucial
Apesar das pressões nas contas externas, o fluxo de investimentos estrangeiros segue robusto. O Investimento Direto no País (IDP) somou US$ 10,9 bilhões em outubro, bem acima dos US$ 6,7 bilhões de um ano antes. No acumulado de 12 meses, o IDP chegou a US$ 80,1 bilhões, o equivalente a 3,63% do PIB — ritmo que tem ajudado a sustentar o financiamento do déficit sem criação de tensões imediatas no mercado.
O BC também registrou ingressos líquidos de US$ 3,2 bilhões em investimentos em carteira no mês, com entrada tanto em renda variável quanto em títulos de dívida. Embora esse tipo de fluxo seja mais volátil, os dados mostram que o ambiente global e doméstico ainda tem permitido entrada de recursos em termos líquidos.
Mesmo assim, analistas reforçam que esse equilíbrio depende de confiança. Como afirma Sanches Junior, “o Brasil segue financiando o déficit com relativa tranquilidade, mas essa estabilidade exige um cenário de confiança contínua para evitar pressões sobre câmbio, juros e o próprio financiamento das transações correntes”.