Tributação de LCIs e LCAs pode encarecer comida e moradia e pesar no bolso do brasileiro
A proposta do governo de tributar em 5% investimentos antes isentos como as Letras de Crédito Imobiliário (LCIs), do Agronegócio (LCAs), possibilidade que se estende também para os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) e do Agronegócio (CRA), provocou alarme nos setores da construção civil e do agronegócio. As consequências, segundo especialistas e representantes das áreas afetadas, podem respingar diretamente nos preços dos alimentos e da habitação – dois dos maiores gastos das famílias brasileiras.

O plano, anunciado pelo ministro da Fazenda Fernando Haddad no último domingo (8), tem como objetivo recompor receitas após o recuo do governo na tentativa de aumentar o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). A taxação deverá valer apenas a partir de 2026, respeitando o princípio da anualidade, e incidirá apenas sobre novas emissões.
A repercussão, contudo, foi imediata. O temor é que o fim da isenção encareça o crédito e, por consequência, a cadeia produtiva que desse financiamento. “Crédito mais caro e escasso pode levar os bancos a adotarem uma postura mais cautelosa”, alerta Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research. “A elevação do custo atinge diretamente as operações financeiras das empresas e encarece o crédito das famílias, gerando incertezas no curto prazo e impactos negativos sobre a atividade econômica.”
A leitura dos setores afetados é direta: sem a atratividade fiscal, os bancos precisarão oferecer retornos maiores aos investidores para manter a demanda por esses papéis. Esse custo será repassado aos tomadores finais de crédito: produtores rurais, incorporadoras e consumidores. “Se o financiamento para plantar e construir encarece, é possível que o preço do alimento e do imóvel suba”, resume Sung.
LCAs e outros títulos tributados: impacto na espinha dorsal da economia
Os números deixam claro o peso dessas cadeias produtivas para a economia. O agronegócio emprega cerca de 30 milhões de pessoas, quase 26% da força de trabalho nacional, e respondeu por 23% do PIB brasileiro em 2024. A construção civil, por sua vez, empregou 7,8 milhões em 2024.
No agro, as LCAs são vitais para a captação de recursos livres para crédito rural. Nos primeiros nove meses do atual Plano Safra, R$ 68,8 bilhões foram financiados por meio dessas letras. Já no setor imobiliário, as LCIs cumprem papel análogo, sendo uma das principais ferramentas privadas para financiar empreendimentos e aquisições residenciais, sobretudo de longo prazo.
A bancada ruralista, que soma mais de 300 deputados e 40 senadores, já prometeu barrar a medida no Congresso assim que ela foi publicada e enviada para análise. Mesmo parlamentares da base aliada do governo, especialmente nas regiões agrícolas, também manifestaram desconforto.
Integrantes do Planalto admitem, em caráter reservado, preocupação com o desgaste político e o impacto sobre a popularidade de Lula junto à classe média investidora – uma fatia crescente do eleitorado que busca aplicações isentas de imposto.
Embora Haddad insista que os títulos “continuarão atrativos” mesmo com 5% de tributação, o corte na rentabilidade líquida pode provocar uma migração de recursos para opções ainda isentas.
Para bancos médios, que dependem fortemente de LCIs e LCAs para funding, o desafio será oferecer taxas mais altas para competir com CDBs e outros produtos. Isso pode estreitar os spreads e tornar o crédito menos acessível. Incorporadoras e empresas do agro já sinalizam apreensão: os custos de emissão de CRIs e CRAs, caso também percam a isenção, deverão subir — com impacto direto sobre o preço final de imóveis e alimentos.