A aprovação da Medida Provisória 1303, que modifica o regime de tributação sobre os investimentos, pode penalizar um dos setores mais pujantes da economia brasileira: o agronegócio. Os especialistas destacam que as mudanças devem reduzir a atratividade dos investimentos em Letras de Crédito Agrícolas (LCAs), Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) e Fiagros, além de encarecer o financiamento do setor.
Responsável por cerca de um quarto do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, o agronegócio brasileiro deve entregar uma safra recorde de grãos até o fim do ano, mesmo num cenário em que recebe subsídios governamentais muito menores do que a média dos países desenvolvidos membros da Organização para a Cooperação do Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Na média da OCDE, os governos concedem subsídios que equivalem a 13,7% do PIB — no Japão, esse valor chega a 32,6%. No Brasil, na média entre 2021 e 2023, esse índice fica em 3,3%. Em 2024, os subsídios oferecidos ao agronegócio somaram cerca de R$ 111 milhões, o equivalente a apenas 16% do total de renúncias fiscais do governo, que totalizaram R$ 679 bilhões.
Esses números foram apresentados por Octaciano Neto, gestor da Zera.Ag, empresa especializada em financiamento privado para o agronegócio, em fala no Congresso Nacional nesta semana, durante audiência pública da comissão mista que avalia a MP 1303.
Com passagem pela área de agronegócio da Suno Asset, dando suporte aos times de gestão dos Fiagros da casa, o SNAG11 e o SNFZ11, ele apresentou outros dados. Por exemplo: hoje, o mercado de crédito privado é responsável pela maior parte do financiamento ao agronegócio brasileiro, ocupando espaço que era de exclusividade da União há 40 anos.
Tributação de investimentos: o que diz a MP
A MP propõe a tributação em 5% dos rendimentos das Letras de Crédito Agrícola (LCAs) e também dos dividendos distribuídos pelos Fiagros, os fundos de investimento que adquirem LCAs e CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio). Com isso, há dois riscos em jogo:
- Os investidores que procuravam esses produtos, atraídos pela isenção dos rendimentos, podem ir atrás de outros títulos e investimentos mais atraentes, inclusive em outros países, provocando fuga de capitais;
- Para evitar a perda de investidores, os emissores terão de oferecer spreads maiores, o que vai encarecer o custo do financiamento, num cenário em que a Selic de 15% ao ano é a maior em duas décadas.
Tudo isso para uma arrecadação que vai ficar longe de resolver os problemas fiscais do país. A projeção é de R$ 7,3 bilhões entre 2026 e 2028, segundo dados da Tendências Consultoria.
E a um custo alto. Aapenas no caso das LCAs, segundo o economista Luiz Caffagni, os juros terão de subir 1,9 p.p. ao ano para manter a remuneração dos investidores com o impacto da tributação. Aumento que certamente será repassado ao consumidor final e pode impactar a inflação de alimentos.
Para Tiago Reis, fundador do Grupo Suno, a derrubada das isenções e as mudanças na tributação prejudicam o pleno funcionamento da economia, ao gerar um ambiente de incerteza que afasta os investidores.
“A pessoa pega o dinheiro e vai investir em outra coisa, até mesmo no agronegócio de outro país. No fim das contas, a tentativa de aumentar a arrecadação acaba dando errado, pois com mais solidez e menos tributos, a economia se movimenta melhor, se consolida, a gera mais receita para o Tesouro no longo prazo”, afirmou ele ao comentar as mudanças da tributação durante live nesta quarta-feira.
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